A geopolítica da Copa do Mundo
O futebol pode até ser o esporte mais popular do mundo, mas isso não significa que todos os países estejam competindo em pé de igualdade
Chegamos agora à 22ª Copa do Mundo, no Catar. Esqueça os 11 contra 11 em condições iguais: o momento em que os jogadores pisam o gramado é apenas a conclusão de muitos acontecimentos que vieram antes.
Neste texto, não estamos falando de treinamentos, táticas ou esquemas de jogo, mas da realidade do mundo atual. Estamos tratando da riqueza e da pobreza das nações, do lugar de cada país no globo, das condições de vida das populações. Fatores que, no fim das contas, influenciam muito a prática de esportes.
O futebol é bacana para abordar estes temas: é tido como o esporte mais popular do mundo, praticado em todos os países.
O que é um país?
Na Copa, cada seleção representa um país. Mas o que é exatamente um país? Parece óbvio, mas não é: enquanto a ONU (Organização das Nações Unidas) agrupa 193 países, a Fifa (federação mundial do futebol) reconhece 211 seleções nacionais. Como se explica essa diferença? Basicamente, pelo fato de que a definição de país depende de vários fatores. Pode-se dizer que um país é um Estado com território definido, população permanente, governo, soberania nacional e reconhecimento internacional.
Por depender de reconhecimento, as relações diplomáticas influenciam a avaliação. Um exemplo é Taiwan. Apesar de ter fronteiras, instituições e 24 milhões de habitantes, a ilha não é reconhecida como país pela ONU, pois a China a considera uma província rebelde – e impõe sua posição aos demais. Já a Fifa a reconhece.
+ A Guerra Civil que deu origem às tensões entre China e Taiwan
Na ONU, os britânicos estão representados pelo Reino Unido, país que nos campos de futebol é representado por quatro seleções: Inglaterra e País de Gales, que estão na Copa do Catar, Escócia e Irlanda do Norte, que não se classificaram. O país é um só no sentido institucional e político, mas as suas quatro unidades têm costumes, línguas e tradições específicas.
Apenas sete minúsculos países aderentes à ONU não participam da Fifa, como o principado de Mônaco e a ilha de Palau, no oceano Pacífico. Em sentido contrário, a Fifa reconhece como países Hong Kong e Macau (regiões administrativas da China), Palestina (sob controle de Israel) e Porto Rico (território associado aos EUA), entre outros.
Ricos x pobres
A riqueza de uma nação conta muito para o desempenho esportivo de um povo, pois as pessoas precisam ter condições básicas satisfatórias, como casa e comida, para poder inserir com qualidade o esporte em sua vida.
Claro que não há determinismo, mas há facilidades e tendências. Veja: a riqueza bruta das nações é medida pelo PIB (produto interno bruto), que soma tudo o que é produzido num ano. Entre os dez países com o maior PIB do mundo hoje, sete estão na Copa do Catar, e quatro deles – Alemanha, Inglaterra (Reino Unido), França e Itália – têm juntos mais da metade dos títulos das Copas do Mundo: 11 títulos das 21 já disputadas. Dos dez, apenas a Índia jamais disputou a copa. O top 10 soma 2/3 do PIB mundial.
+ Entenda como o PIB é calculado
Já entre os dez países com o menor PIB (somam juntos apenas 0,01% da produção mundial), nenhum jamais participou da competição. Entre eles, pequenas nações da África, do Caribe e da Oceania.
Fatores como a disseminação do esporte e a tradição ajudam muito, e o Brasil está aí para provar. População grande também, mas, como se sabe, China e Índia jamais tiveram seleções de destaque.
O que diz o IDH
Outra forma de computar a riqueza das nações é pelo IDH (Índice de Desenvolvimento Humano). Ele mede não só a riqueza bruta, mas o seu impacto no nível de vida das pessoas, por meio de três índices: expectativa de vida (inclui acesso à saúde e bem-estar geral), educação (dados sobre o nível geral de escolaridade) e a renda per capita.
Esse índice aponta realidade semelhante à do PIB: entre os 10 países com maior IDH, 5 estão na Copa (incluindo a tetracampeã Alemanha), e apenas um nunca participou: a pequena Hong Kong.
Nenhum dos dez países com pior IDH – sendo 9 africanos e um da península arábica – participou de uma Copa, mesmo havendo alguns relativamente populosos: Iêmen e Moçambique possuem mais de 30 milhões de habitantes. Entre os dez, estão os países com a menor média de anos na escola – Burkina Fasso e Níger, com 2 anos e 1 mês de educação formal –, a menor expectativa de vida ao nascer – o Chade, com 52 anos e 6 meses – e a menor renda per capita – o Burundi, com 732 dólares ao ano por habitante.
Em meio a tanta dificuldade, não dá para jogar bola bem.
Um mundo de línguas
Na fase de grupos da Copa, haverá 48 partidas. Em 5 delas, os jogadores das seleções compartilham a mesma língua, como em Inglaterra x Estados Unidos, ou Argentina x México. O inglês é a língua oficial de sete dos 32 países representados, seguido por espanhol e francês, com seis países cada.
A explicação é histórica: Inglaterra, França e Espanha foram grandes impérios coloniais do passado e espalharam suas línguas, costumes e cultura por boa parte do mundo. Mesmo nações nas quais a população pratica diversas línguas regionais, como Gana, na África, o idioma da antiga metrópole prevalece como oficial – no caso, o inglês. Outros países são multilinguísticos, como a Suíça, que apresenta inglês, francês e alemão como línguas oficiais.
+ Filmes e livros para entender a colonização da África
Alta tensão em campo
Argentina e Inglaterra enfrentaram-se em campo na Copa do Mundo do México, em 1986
Conflitos que permeiam o mundo atual envolvem boa parte dos países, incluindo os da Copa. A ONU hoje mantém 12 forças de paz ativas em locais de conflitos pelo globo, que contam com a colaboração ativas de diferentes países, que enviam soldados, oficiais, policiais ou especialistas. Dos 32 países presentes no Catar, apenas 2 não têm nenhuma participação nestas 12 missões: Arábia Saudita e Costa Rica. O Brasil, depois que encerrou a missão no Haiti (onde tinha centenas de soldados), integra agora 8 missões, com 82 pessoas enviadas – 41 oficiais, 22 especialistas, 11 policiais e 8 soldados.
Há jogos que envolvem forte tensão geopolítica. O caso mais agudo é o de Estados Unidos X Irã (marcado para 29 de novembro), que mantêm um conflito diplomático intenso nas últimas 4 décadas, desde a Revolução Islâmica de 1979. Nos anos 1980, os EUA sustentaram o Iraque em 8 anos de guerra contra o Irã. Em 2002, os norte-americanos inseriram o regime iraniano na lista de países do “eixo do mal”. Há décadas, o Irã sofre sanções econômicas lideradas pelos EUA, e seu regime se situa como inimigo da Casa Branca e de sua influência no mundo. Lembre-se que esta Copa é bem pertinho do Irã!
+ Irã, Arábia Saudita e petróleo: entenda a Guerra Fria do Oriente Médio
Outra rivalidade geopolítica forte pode se expressar, nas oitavas ou nas quartas de final, caso se cruzem Inglaterra (grupo B) e Argentina (grupo C), que travaram uma guerra em 1982 pelo controle das ilhas Malvinas – chamadas de Falklands pelos britânicos –, arquipélago próximo à costa argentina. A guerra, iniciada com a ocupação das ilhas pelas tropas da Argentina – na época, sob ditadura militar –, acabou 50 dias depois, com centenas de argentinos mortos pelas tropas britânicas. A Argentina capitulou, mas não se conforma: insiste em negociar a soberania do arquipélago, e o Reino Unido não aceita. Quando se encontram, sempre sai faísca!
Prepare-se para o Enem sem sair de casa. Assine o Curso PASSEI! do GUIA DO ESTUDANTE e tenha acesso a todas as provas do Enem para fazer online e mais de 180 videoaulas com professores do Poliedro, recordista de aprovação nas universidades mais concorridas do país.