‘A voz suprema do blues’: entenda contexto histórico do filme da Netflix
Produção protagonizada por Viola Davis é o último trabalho de Chadwick Boseman e mostra o machismo no mundo da música
Nesta sexta-feira (18) estreia o filme “A voz suprema do blues” da Netflix, uma adaptação original da peça teatral de August Wilson sobre a cantora Ma Rainey, conhecida como a “mãe do blues”, que é interpretada pela premiada Viola Davis. A produção se passa em Chicago, nos anos 1920, e acompanha a relação conturbada da artista com a indústria da música, principalmente com os seus empresários brancos que tentam controlá-la a todo custo.
A narrativa explora também os conflitos durante uma sessão de gravação de álbum entre a cantora e seu trompista, o ambicioso Levee, interpretado por Chadwick Boseman. Este é o último trabalho do ator — eternizado no papel de “Pantera Negra” —, que morreu em agosto de 2020, aos 43 anos, devido a complicações do câncer de cólon.
Ao longo dos anos o blues ficou conhecido por ser um estilo musical dominado por homens, mas no início do século 20 o cenário era diferente. As mulheres foram as grandes protagonistas do gênero. Elas faziam pequenas turnês nos Estados Unidos ao lado de bandas para se apresentar em casas de shows, isso ajudou a popularizar o ritmo no país.
Apesar de não ter inventado o blues, Ma Rainey (1836-1939) foi a primeira cantora desse estilo a ficar famosa na cultura norte-americana. Acontecimento que lhe proporcionou o apelido de “mãe do blues”. “Na época, o mercado fonográfico era muito machista, só homens tinham a oportunidade de gravar discos. Ela foi muito importante para trazer a voz feminina e quebrar alguns paradigmas na indústria“, afirma o cantor e guitarrista de blues Igor Prado — primeiro artista sul-americano a atingir o topo da parada “Living Blues Chart” nos EUA.
Pouco tempo depois de ser contratada por um produtor da Paramount Records em 1923, Ma Rainey lançou as primeiras gravações de canções como “Bad Luck Blues” e “Moonshine Blues”.
Grandes artistas tiveram as carreiras influenciadas pela musicalidade da cantora mesmo após a sua morte precoce em 1939, aos 53 anos. Bob Dylan, por exemplo, cita Ma Rainey ao lado de Beethoven na canção “Tombstones Blues”, lançada em 1965.
Origem do blues
As raízes musicais do gênero remetem aos escravos das fazendas de algodão, no fim do século 19, que andavam pelas margens do rio Mississipi nos Estados Unidos. Durante o percurso, eles cantavam melodias lentas e chorosas para expressar os sentimentos de tristeza devido às péssimas condições a que eram submetidos. As canções tinham letras que geralmente falavam como superar a vida difícil do campo. Além disso, elas também marcavam o ritmo da caminhada.
O termo “blues” faz referência à cor azul, associada a tristeza, melancolia ou frieza. Tanto que há várias expressões em inglês com a palavra, como “blue Monday”, sobre a melancolia da segunda-feira.
O ritmo musical nasceu principalmente da mistura da cultura africana com as canções tradicionais do folclore americano. “Conheci o guitarrista Robert Lockwood, que trabalhou com o cantor Robert Johnson. Em uma de nossas conversas, ele disse que era muito difícil datar como surgiu e de onde veio o blues, mas tudo indica que o ritmo estava ligado às lavouras de algodão e aos cultos de igrejas frequentadas pela população negra”, afirma Prado.
Neste período, acontecia a Guerra Civil Americana (1861-1865), que se caracterizou por um embate entre o Norte, mais industrializado e antiescravagista, defensor de ideais de liberdade e igualdade. E o Sul, predominantemente agrário, onde os fazendeiros eram contra esses princípios e não estavam dispostos a parar de usar a mão de obra escrava.
Com o fim do conflito, milhares de ex-escravos do Sul migraram para o Norte em busca de trabalho. Eles se concentraram principalmente nos grandes centros industriais, nas cidades de Detroit e Chicago — região que ganhou vários bares tradicionais de blues.
De lá para cá, blues se tornou um dos gêneros musicais mais populares do mundo, responsável por influenciar diversos outros estilos como jazz, country e rock‘n roll.
Blues no Brasil
De acordo com Prado, as bandas de blues começaram a chegar ao Brasil apenas no fim dos anos 80, depois da primeira edição do Festival de Ribeirão Preto que trouxe nomes como Etta James e Buddy Guy. “Mas a música brasileira é muito influenciada pelo ritmo antes desse período, mesmo sem o público conhecer o gênero”, conta. Isso acontecia porque, desde o início do século passado, muitos artistas faziam turnês na Europa e voltavam com diversas referências musicais. “Acredito, por exemplo, que a bossa nova tem muitas características do blues”, acrescenta.
O cantor ainda revela que o pandeirista Nereu, de Jorge Ben, contou em uma conversa que, pelo fato de os artistas brasileiros não conhecerem o blues, eles colocaram o nome de “samba-rock” no gênero musical criado na década de 1950. “Se você analisar, o ritmo deveria se chamar ‘samba-blues’, porque ele tem mais elementos rústicos do que de rock”, afirma.
Prepare-se para o Enem sem sair de casa. Assine o Curso Enem do GUIA DO ESTUDANTE e tenha acesso a centenas de videoaulas com professores do Poliedro, que é recordista em aprovações na Medicina da USP Pinheiros.