Entenda o atendimento especializado para autistas no Enem
'Sem o atendimento especializado, eu não conseguia terminar no tempo padrão', relata estudante autista aprovada em Medicina
O diagnóstico de autismo, há um ano, foi uma virada de chave na vida da paulista Marcela Andrade. A partir do entendimento do transtorno, a jovem de 23 anos passou a perceber melhor alguns gatilhos sensíveis a ela, como o barulho e a luz, e procurar recursos para se sentir mais confortável diante deles. O diagnóstico também possibilitou que ela usufruísse, pela primeira vez, de adaptações que lhe são de direito por lei: entre elas, o pedido de atendimento especializado no Enem 2021.
Diagnosticada com nível 1 de suporte de autismo e com TDAH (Transtorno do déficit de atenção com hiperatividade), ela teve direito a um tempo adicional de uma hora em cada dia de prova e a uma sala individual. “Nas quatro edições anteriores do Enem que eu realizei, sem o atendimento especializado, eu não conseguia terminar no tempo padrão. A adaptação fez toda a diferença”, conta a estudante que garantiu uma vaga em Medicina na UNIFAL (Universidade Federal de Alfenas) por meio do Sisu 2022/1.
O autismo é um distúrbio do neurodesenvolvimento caracterizado pela dificuldade na comunicação e interação e na realização de comportamentos repetitivos. Jeane Rodrigues, psicopedagoga, terapeuta e conselheira estadual da Organização Neurodiversa pelos Direitos dos Autistas, a ONDA-Autismo, explica que existem três níveis do distúrbio.
A especialista, que também é autista e mãe de um garoto dentro do espectro, esclarece que os níveis são determinados pela independência e autonomia nas atividades de vida diária. Diferente do que muitas pessoas ainda acreditam erroneamente, o QI (quociente de inteligência) não é um fator determinante para descrever o transtorno. “Resumindo, o nível do autismo é o quanto você depende da ajuda de outras pessoas ou de suporte no dia a dia e adaptações no seu ambiente de trabalho e escolar”, explica Jeane.
Diante dessa diversidade em relação ao diagnóstico, a psicopedagoga ressalta a importância dos vestibulares levarem em consideração os níveis e a individualidade (e necessidade) de cada indivíduo para adaptar e garantir o bem estar e segurança dos candidatos com deficiências.
Direitos nos vestibulares
A Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, de 2015, determina que instituições de ensino superior e de educação profissional e tecnológica, sejam elas públicas ou privadas, ofereçam atendimento preferencial aos estudantes com deficiência. Esse atendimento vale tanto nos processos seletivos para ingresso como na permanência nos cursos.
Dentro das exigências, está a tradução completa do edital e de suas retificações em Libras e a disponibilização de formulário de inscrição de exames com campos específicos para que o candidato com deficiência informe os recursos de acessibilidade e de tecnologia assistiva necessários para sua participação.
As provas, de acordo com a lei, devem ter formatos acessíveis, além da possibilidade de acréscimo de tempo de aplicação, se necessário. Outra exigência do Estatuto da Pessoa com Deficiência é a adoção de critérios de avaliação das provas escritas, discursivas ou de redação que considerem a singularidade linguística da pessoa com deficiência, no domínio da modalidade escrita da língua portuguesa.
Lembrando que os autistas foram classificados, definitivamente, como pessoas com deficiência, em 2012, a partir da Lei Federal n° 12.764. A norma acabou batizada com o nome de uma principais defensoras dos direitos das pessoas com TEA, Berenice Piana. A Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista garantiu mais direitos e ampliou as informações sobre o transtorno à sociedade.
Atendimento especializado no Enem
Além dos estudantes com transtorno do espectro autista, o edital do Enem também garante que candidatos com baixa visão, cegueira, visão monocular, deficiência física, deficiência auditiva, surdez, deficiência intelectual (mental), surdocegueira, dislexia, deficit de atenção, discalculia, gestante, lactante, idoso, estudante em classe hospitalar possam solicitar atendimento especializado.
O pedido é feito na hora da inscrição. O participante precisa inserir um documento legível que comprove a condição que motiva a solicitação de atendimento especializado. Nele deve conter o nome completo do candidato, o diagnóstico com a descrição da condição que motivou a solicitação e/ou o código correspondente à Classificação Internacional de Doença (CID 10), além da assinatura e identificação do profissional competente, com respectivo registro do Conselho Regional de Medicina (CRM), do Ministério da Saúde (RMS) ou de órgão competente.
O pedido passa por uma análise e o resultado sai na Página do Participante, em data indicada no cronograma oficial. Em caso de reprovação da documentação anexada, o participante poderá solicitar recurso e deverá inserir novo documento que comprove a necessidade de recursos especializados, segundo o edital do exame.
Marcela conta que não teve problemas com a solicitação para o atendimento especializado no ano passado. Ela anexou o laudo assinado pela psiquiatra e pediu a hora adicional de prova. O pedido foi aprovado pelo Inep e lhe foi concedido também um sala individual. “Fiquei aliviada de fazer a prova sozinha. Eu tenho muita fragilidade auditiva e o barulho me atrapalha bastante”, conta a estudante.
Vale ressaltar que o tipo de atendimento especializado varia de acordo com a condição, níveis de comorbidade e necessidade de cada estudante. No autismo, e em alguns outros casos, como surdez e dislexia, existe a possibilidade uma correção da redação diferenciada, por exemplo. Participantes do espectro autista que tiverem sua solicitação confirmada pelo Inep poderão também utilizar caneta transparente com tinta colorida para proceder marcações em seu caderno de questões.
As informações e regras de cada caso é especificada nos editais. Por isso, tanto no Enem como em outros vestibulares, é importante que os candidatos leiam com atenção os documentos que garantem seus direitos. Afinal, eles são um passo importante para um ensino superior mais inclusivo.
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