Acredite ou não, mais de 64% dos brasileiros não se recordam em quem votaram para deputado federal e senador, segundo uma pesquisa Datafolha divulgada em agosto deste ano. Isso acontece porque há uma ideia de que quem manda mesmo é o presidente, e os cargos do legislativo nacional são secundários.
Na verdade, senadores e deputados são parte importante da condução do país. Isso vale especialmente para o Brasil, que tem o chamado presidencialismo de coalizão como característico desde a redemocratização. O termo foi criado há mais de três décadas pelo cientista político Sérgio Abranches para explicar a relação entre presidente e congressistas em um país como o Brasil, em que o poder legislativo é dividido entre muitos partidos políticos. Essa configuração força o presidente a construir alianças para governar – como ocorre em países parlamentaristas.
+ Qual a diferença entre parlamentarismo e presidencialismo
Carolina Botelho, pesquisadora do pós-doutorado do Mackenzie, explica o que isso significa na prática. “É uma negociação eterna”, diz. “O presidente negocia com lideranças, com partidos, dentro de instâncias democráticas do Congresso para tentar realizar a agenda pactuada”.
Entender essa dinâmica é essencial para que todos os brasileiros possam exercer plenamente sua cidadania, votando com informação e consciência. Mas saber sobre o que fazem os eleitos para o parlamento é especialmente importante para o vestibulando, já que as funções e ações do poder legislativo podem aparecer em questões das provas – como por exemplo uma pergunta sobre a participação política das mulheres no Enem de 2017.
Além disso, estar ligado no que rola no Congresso Nacional ajuda na preparação para propostas de intervenção da redação. Imagine o seguinte tema: a suspensão do piso salarial dos trabalhadores de enfermagem. Até aí, você pode pensar que deputados e senadores nada têm a ver com isso, já que a suspensão aconteceu por uma decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) em setembro deste ano. Mas não é bem assim. Recentemente, um senador propôs que recursos do chamado “orçamento secreto” fossem utilizados para custear o piso. Essa poderia, por exemplo, ser uma proposta de intervenção.
Saber quais são as competências – e com isso os poderes – de cada cargo eleito é essencial na hora de construir uma boa argumentação.
Pensando em tudo isso, o GUIA DO ESTUDANTE preparou uma série de reportagens para você ficar por dentro de todos os cargos decididos nas eleições de 2022 – e de quebra conhecer ferramentas para escolher o melhor candidato para você.
Na prática, o que faz um senador e o que faz um deputado federal?
Antes de tudo, um resuminho para você ter na ponta da língua:
Deputados
Função legislativa: propor novas leis e modificar as existentes;
Função fiscalizadora: monitorar financeira e patrimonialmente os atos do Executivo .
Senadores
Função legislativa: criar novas leis, alterar as existentes e revisar projetos que já passaram nas mãos dos deputados;
Função fiscalizadora: estabelecer o rito para julgamento de possíveis crimes de responsabilidade do presidente, vice e ministros (como os impeachments);
Aprovação de autoridades: avaliar indicados do Executivo para diversos cargos.
“Primos” legislativos
O Congresso Nacional é formado por senadores e deputados federais. Para os dois cargos, os eleitos representam o seu estado no poder Legislativo, isto é, no ambiente de criação e alteração de leis. Para isso, em ambas as casas, há comissões específicas para discussão de assuntos diversos (meio ambiente e relações internacionais, por exemplo). Os congressistas também podem se organizar em frentes, que nada mais são do que grupos que se mobilizam em torno de um interesse.
Os parlamentares também têm as funções de fiscalizar o poder Executivo (presidente e ministros), usando mecanismos como CPIs (Comissões Parlamentares Investigativas) – lembra da que aconteceu em 2021 sobre a pandemia?
Sabendo disso, fica o primeiro alerta: nem senadores nem deputados federais podem prometer executar ações – cuidado ao atribuir esta função a eles na proposta de intervenção! Congressistas podem apenas dizer que vão trabalhar em diretrizes para que certas ações ocorram. Assim, um candidato ao Congresso não pode afirmar que vai construir mais escolas ou hospitais em seu estado. Mas pode (e deve) votar em projetos importantes para direcionar orçamento para a educação ou para a saúde.
Câmara vs Senado
Então, qual é a diferença entre Senado e Câmara? As casas trabalham com as mesmas funções legislativas, mas diferem na velocidade da aprovação de matérias, explica Carolina Botelho. “A Câmara tem um timing mais rapido”, diz. “Por isso concentra a maior negociação entre legislativo e executivo”. Os deputados somam 513, enquanto os senadores são 81.
Senadores também têm alguns poderes a mais que deputados federais. São eles que decidem, por exemplo, o rito para impeachment do presidente (foi a casa quem decidiu como a apuração de Fernando Collor de Melo ocorreu em 1992, processo que foi repetido no impeachment da presidente Dilma Rousseff em 2016). Também são os eles os responsáveis por aprovar autoridades indicadas pelo Executivo para certos cargos, como os ministros do Supremo Tribunal Federal, embaixadores brasileiros e o presidente do Banco Central.
Por fim, enquanto senadores têm mandatos de oito anos, a Câmara é renovada a cada quatro anos.
+ Conheça a história do impeachment no Brasil
Dança das cadeiras
Os parlamentares também são eleitos de forma diferente. É mais simples para senadores: quem tiver mais votos, leva o cargo e representa o estado em Brasília. Já para os deputados, a quantidade de vagas varia de acordo com o tamanho da população do estado. E vem aí o segundo alerta. Os representantes da Câmara são eleitos de forma proporcional a partir do chamado quociente eleitoral, que é a soma dos votos válidos dividida pelo número de cadeiras disponíveis na Câmara. Apenas partidos que tiverem votos para atingir esse quociente têm direito a uma vaga. Uma vez que o partido consegue esse direito, ele pode “puxar” seus candidatos mais votados para uma quantidade determinada de vagas.
“Por isso o primeiro olhar que se deve fazer é se a bandeira do partido é viável e se o eleitor a entende como certa”, avisa Carolina Botelho. “Pode acontecer de pessoas votarem em um candidato cuja legenda não tem voto o suficiente para ocupar a cadeira da Câmara, ou votarem em um indivíduo que vai puxar outros do partido, sem se dar conta disso”.
Como escolher o seu senador e seu deputado federal
Agora que você já sabe as atribuições dos congressistas, já pode eliminar aqueles que fazem promessas que extrapolam seus poderes. Independente da matiz ideológica, o conselho é o mesmo: “fuja de discurso fácil”, diz Carolina Botelho. “A política é importante e fundamental, temos de saber separar o ofício da política do mau político”. Um passo para fazer isso é analisar o passado e o suposto futuro do candidato, para entender se você quer mesmo votar nele no presente.
Algumas ferramentas online são úteis para avaliar o histórico. Se o seu candidato está concorrendo à reeleição ou já exerceu outro cargo legislativo, os próprios sites da Câmara e do Senado disponibilizam informações sobre a atuação de seus parlamentares, como os projetos de lei propostos por eles, discursos que fez em plenário etc. No caso da Câmara, há ainda a opção de “acompanhar” o seu congressista e receber atualizações sobre ele por e-mail.
Você também pode procurar o histórico relacionado a temas que considere mais importantes. O Radar do Congresso reúne informações sobre votações importantes, a taxa de presença de cada parlamentar nos plenários e seu governismo – isto é, quão alinhados são ao Executivo.
Já para tentar vislumbrar o futuro, o DivulgaCand, do TSE, reúne a lista de doadores de campanha e informações sobre o partido do candidato ao Congresso.
Por fim, do mesmo jeito que você segue avidamente seu crush nas redes, vale fazer o mesmo com o seu interesse político. As redes sociais dos candidatos são uma boa forma de se manter atualizado sobre a campanha. Para verificar se o discurso de cada um bate com a realidade, você pode contar com as checagens, como as feitas pelo projeto Comprova.
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