Resumão Enem: como estudar movimentos sociais
As principais informações sobre o Movimento Negro, Feminista e LGBT+ que você precisa saber antes de fazer a prova do Enem
Os movimentos sociais são temas mais que frequentes nos vestibulares. Nos últimos anos, as provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) têm dedicado pelo menos um exercício ao tema em cada edição. As lutas, os principais atos e os nomes que protagonizam os movimentos são informações relevantes para se ter em mente antes de realizar a prova.
Em 2015, uma questão usou a célebre frase de Simone de Beauvoir, “Não se nasce mulher, torna-se mulher”, para abordar as lutas feministas no século 20. No mesmo ano, o tema da redação foi “A persistência da violência contra a mulher na sociedade brasileira”.
Em 2018, uma pergunta relacionou gírias LGBT à questão da definição de patrimônio linguístico. E em 2017 e 2018, exercícios sobre as raízes e efeitos do racismo figuraram na prova.
O GUIA convidou três professores para resumirem alguns pontos dos três dos principais movimentos sociais atuais: o movimento negro, o movimento feminista e o movimento LGBT+.
Movimento Negro
Definição
A professora Juliana Bueno, que leciona Cultura Popular Brasileira na escola Camino School, explica que o Movimento Negro (MN) é o nome genérico dado ao conjunto dos diversos movimentos sociais afro-brasileiros. “Pensar o movimento negro é pensar o contexto histórico, os desafios que cada um e cada uma enfrentou para que as histórias fossem contadas”.
Breve histórico
O racismo estruturado e o silenciamento de vozes pretas no decorrer da história fazem com que pesquisadores tenham uma maior dificuldade para estudar o movimento.
“Temos muitas pesquisas em andamento para a gente conhecer melhor essa história” explica a professora. Tal exclusão histórica dos livros faz com que muito pensem o movimento negro como algo recente. Questionada sobre uma data inicial para o movimento, ela afirma que se pode dizer que “um dia seguinte depois da abolição [da escravidão] o movimento já se colocou em marcha, para reivindicar escolas para as crianças negras, com experiências bem-sucedidas como a Frente Negra Brasileira”.
A Frente Negra foi criada em 1931, em um período de efervescência política no Brasil, com um papel importante na busca por políticas de ações afirmativas. Ela foi interrompida com o golpe de Estado de Getúlio Vargas, o que representou, segundo a professora, o primeiro grande momento no século 20 que impossibilitou o avanço das lutas do movimento negro brasileiro.
Nos anos 70, nasce o Movimento Negro Unificado (MNU), que foca mais efetivamente nas políticas afirmativas, principalmente na educação. “O MNU só ganha destaque mesmo em 2001, na Conferência de Durban, a primeira Conferência Mundial contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e as Formas Conexas de Intolerância” lembra Bueno.
Segundo os dados, o encontro teve a participação de 173 países, 4 mil organizações não governamentais (ONGs) e um total de mais de 16 mil participantes. O Brasil levou 42 delegados e cinco assessores técnicos.
“Um importante papel coube ao nosso país: Edna Roland, mulher, negra e ativista, foi a relatora geral da conferência, representando também as minorias vítimas de discriminação e intolerância.” Esse é o momento em que o Brasil assume que existe racismo e se compromete em implementar políticas de ações afirmativas, como a criação de um sistema de cotas para estudantes negros nas universidades.
Algumas das principais conquistas
- As Leis de Cotas, de 2012 e 2014, que preveem a entrada de estudantes negros em universidades e instituições de ensino públicas;
- A Lei Caó, de 1989, que prevê detenção de um a cinco anos para crime de discriminação racial;
- A instituição do dia 20 de novembro como Dia Nacional da Consciência Negra e a inclusão do ensino de história afro-brasileira e africana no currículo escolar básico, ambas em 2003.
Nomes para ir atrás
São vários os líderes do Movimento Negro no Brasil e no mundo. Entre os principais, podemos citar: Zumbi dos Palmares; Dandara dos Palmares; Luís Gama; Laudelina de Campos Melo; Tereza de Benguela; Milton Santos; Kabengele Umnanga; José Vicente; Professor Eduardo de Oliveira; Marielle Franco; Djamila Ribeiro; Conceição Evaristo; Lélia Gonzales; José do Patrocínio; André Rebouças; João Cândido; Nelson Mandela; Amelia Boynton Robinson; Angela Davis; Bayard Rustin; James Bevel; James Meredith; Malcolm X; Martin Luther King Jr.; Mumia Abu-Jamal; Rosa Parks; e W. E. B. Du Bois.
Para saber mais
++ Glossário para entender o Movimento Negro nas redes sociais (e fora delas)
++ Proposta de redação do Enem: “Caminhos para combater o racismo no Brasil”
++ Cotas raciais: quem pode, de fato, concorrer como PPI
++ O caso George Floyd e o debate sobre racismo e violência policial
++ 5 fatos sobre o racismo na educação brasileira
++ 7 séries para refletir sobre o racismo
++ 9 livros de autoras negras que abordam o racismo
++ 10 discursos famosos para refletir sobre o racismo
Movimento Feminista
Definição
A Bruna Silva Marques De Souza é professora de História na Escola Vereda e resume o Movimento Feminista como “um movimento civil de caráter social, político e econômico que defende a igualdade de gênero em todos os campos.” Ela destaca que o movimento não tem uma premissa sexista, e que a ideia não é buscar a superioridade feminina, e, sim, “prezar pela igualdade de direitos entre os gêneros”.
A professora conta que, dentro do feminismo, existem várias vertentes que levam em consideração diferentes características da sociedade. “O feminismo negro, por exemplo, busca não só a igualdade de gênero, mas também a igualdade racial”.
Breve histórico
Souza esclarece que é sempre complexo falar precisamente o momento ou a forma como um movimento surge – ainda mais um como este. “Nunca podemos desconsiderar a luta que veio antes; de alguma forma sempre existiram mulheres que se posicionaram contra a opressão da sociedade, especialmente as sociedades patriarcais.”
Entretanto, a professora diz que é possível ambientar o movimento de forma mais consolidada a partir dos séculos 19 e 20. Quando, sob influência da Revolução Industrial e dos ideais da Revolução Francesa, surgem diversas faces da luta pela igualdade entre os gêneros. “Destaco três momentos, dentre vários, que fizeram parte desse processo.”
O primeiro deles é o Movimento Sufragista, que tinha como principal reivindicação a participação feminina nas eleições, que teve impacto em diversos países e possui diferentes vertentes de ação. A professora lembra que é importante ressaltar também o papel que as mulheres tiveram na Revolução Industrial, e como essa participação contribuiu para a visão mais igualitária da capacidade feminina.
“O segundo momento que destaco é a Passeata das Mulheres, em Nova York, em fevereiro de 1909, que tinha como principal reivindicação melhores condições de trabalho”.
O terceiro ponto está em solo brasileiro e é a conquista do acesso das mulheres à educação. “Ele acontece com a aprovação de uma lei em 1827, ainda durante o Império, que assegurava o direito, até então negado, de mulheres terem acesso à educação básica”. A implementação da lei é um ponto fundamental do movimento no Brasil e foi, na época, envolta de polêmicas e discussões. O conteúdo ensinado aos meninos era mais amplo e aprofundado que os das meninas, e uma das falas do senador Visconde de Cayru, arquivada no Agência do Senado, exalta a visão do período carregada de diferenciação entre os gêneros.
“A questão é se as meninas precisam de igual grau de ensino que os meninos. Tal não creio. Para elas, acho suficiente a nossa antiga regra: ler, escrever e contar. Não sejamos excêntricos e singulares. Deus deu barbas ao homem, não à mulher […] Em geral, as meninas não têm um desenvolvimento de raciocínio tão grande quanto os meninos, não prestam tanta atenção ao ensino. Parece que a sua mesma natureza repugna o trabalho árido e difícil e só abraça o deleitoso. Basta-lhes o saber ler, escrever e as quatro primeiras operações da aritmética.”
Ainda assim, esse acesso iniciou a lenta mudança da visão do papel da mulher na sociedade brasileira. “Se pararmos para pensar, a educação por si só já tem um caráter libertador, que possibilita a reflexão e o questionamento. Penso que este foi um dos primeiros passos na busca pela igualdade de gênero no Brasil.”
Algumas das principais conquistas
- Garantia do direito de cursar uma faculdade, em 1879;
- Garantia do direito ao voto, em 1932;
- Criação do Estatuto da Mulher Casada, em 1962, que dispensava a autorização do marido para mulheres casadas que quisessem exercer alguma profissão;
- Abertura da primeira Delegacia da Mulher, em São Paulo, em 1985;
- Reconhecimento da mulher como igual ao homem, na Constituição de 1988;
- Aprovação, em 2006, da Lei Maria da Penha, uma das primeiras políticas de combate à violência contra a mulher. E em 2015, a aprovação da Lei do Feminicídio, que reconhece e caracteriza atos o assassinato de mulheres como crime hediondo.
Nome para ir atrás
Sem dúvidas, há diversas mulheres que contribuíram e contribuem para o feminismo, para a discussão da igualdade entre gêneros, para as diferentes ramificações dentro do movimento. Entre elas, pode-se citar Simone de Beauvoir; Marie Curie; Angela Davis; Malala Yousafzai; Susan B. Anthony; Elizabeth Cady Stanton; Emmeline Pankhurst; Bertha Lutz; Judith Butler; Chimamanda Ngozi Adichie; Ada Lovelace; Virginia Woolf; Betty Friedan; Linda Nochlin; Maria Quitéria de Jesus; Rose Marie Muraro; Nísia Floresta; e Djamila Ribeiro.
Para saber mais
++ Glossário do feminismo: entenda os termos usados pelo movimento
++ Como as mulheres conseguiram o direito ao voto
++ Entenda a Lei do Feminicídio e por que ela é importante
++ Dia Internacional da Igualdade Feminina: qual a situação do Brasil?
++ A falta de representatividade feminina nas listas de obras obrigatórias
++ Proposta de redação: Violência de gênero nas universidades brasileiras
++ A luta da mulher negra latina e caribenha
++ 10 fatos sobre a desigualdade de gênero no Brasil
++ 6 mulheres que revolucionaram a ciência
Movimento LGBTQIA +
Definição
Alexandre Nogueira Martins é mestre em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP) e pesquisou no mestrado o processo de lutas contra a LGBTfobia no Brasil. Ele diz que as reinvindicações do Movimento LGBTQIA+ “sempre foram múltiplas e complexas, sendo alguns dos principais eixos o combate à violência cis-heterossexista, a luta por uma educação que combata discriminações de gênero e sexualidade, o combate à discriminação no trabalho, a luta por uma cultura mais diversa e pela não discriminação no direito à saúde pública.”
Breve Histórico
A história do movimento LGBTQIA+ é marcada por um levante conhecido como Revolta de Stonewall, que ocorreu no dia 28 de junho de 1969, em Nova York. Por mais que pequenos atos pró LGBTQIA+ já aconteciam de forma discreta pelos Estados Unidos, a Revolta é um marco simbólico por representar um basta pela opressão e violência policial, em um período em que ainda era crime ser homossexual.
Neste dia, pessoas trans, drag queens, gays e lésbicas confrontaram a polícia, e, de certa forma, toda a violência cis-heterossexista. O ato abriu portas para a celebração anual do orgulho LGBTQIA+ e deu origem às paradas que ocorrem no mundo todo hoje.
“No Brasil, é marcante para [a história do movimento] a organização política de dissidentes sexuais e de gênero a fundação do SOMOS Grupos de Afirmação Homossexual em 1978 em São Paulo e do jornal Lampião da Esquina também em 1978”, diz o professor Martins. Segundo ele, cabe pontuar dois momentos marcantes dos primeiros anos no Brasil ainda durante a ditadura civil-militar. “Em 13 de junho de 1980, o primeiro protesto de rua de grupos homossexuais, com grupos feministas, negros, estudantis e de prostitutas, contra a violência policial e as prisões dessas populações. E em 1983, quando houve um ‘Stonewall brasileiro’, com uma revolta de lésbicas no Ferro’s Bar em São Paulo.”
Ainda na década de 80, as lutas por políticas de combate à epidemia de HIV/AIDS e a participação de um grupo homossexual, conhecido como o Triângulo Rosa, na Assembleia Nacional Constituinte de 1987 marcam a história do movimento no Brasil. Para as décadas de 1990 e 2000, Martins enfatiza as demandas por direitos no Legislativo (ao casamento, à retificação de nome e gênero de pessoas trans e ao combate à violência) e as demandas por políticas públicas para a população LGBTQIA+. Nos dias atuais, porém, ele destaca um momento “de resistência aos discursos de lideranças do governo federal, que legitimam a violência contra a população LGBTQIA+ ao mesmo tempo em que desmontam as políticas que existiam para essa população.”
Algumas das principais conquistas
- A despatologização da homossexualidade no Brasil, em 1985, quando a condição deixou de ser considerada uma doença;
- O programa Brasil Sem Homofobia em 2004, primeiro programa nacional de políticas públicas de combate à LGBTfobia;
- O direito ao casamento de pessoas de mesmo gênero em 2013 (reconhecido pelo Judiciário);
- O direito de pessoas trans à retificação de nome e gênero em seus documentos em 2018 (também pelo Judiciário);
- A equiparação da LGBTfobia a crime, como o racismo, em 2019 (pelo Judiciário também).
Nomes para ir atrás
Alguns nomes que podem interessar quem esteja querendo se aprofundar na história do movimento são Sylvia Riveira; Marsha P. Johnson; Bayard Rustin; Harvey Milk; Michael Dillon; Simon Nkoli; Karl Heinrich Ulrichs; Nancy Cárdenas; Ifti Nasim; Laerte Coutinho; Erica Malunguinho; Jean Wyllys; João Antônio Mascarenhas; Rosely Roth; Fabiano Contarato; Paulo Iotti; Miriam Martinho e João W. Nery.
Para saber mais
++ Dia do Orgulho LGBT: Conheça a história do movimento por direitos
++ Dicionário LGBTQ+: entenda os termos usados pelo movimento
++ 50 anos de Stonewall: a história por trás do mês do orgulho LGBT+
++ O que é homofobia e como ela tem sido tratada pelo Congresso brasileiro?
++ Proposta de redação: Transfobia em debate no Brasil
++ O combate à homofobia no Brasil e no mundo
++ 15 documentários sobre diversidade
++ Linguagem neutra: bobagem ou luta contra a discriminação?
++ 12 livros para estudar a história do movimento LGBTQIA+
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