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TikTok x EUA: o que o confronto diz sobre a atual guerra de dados?

Para EUA, app compartilharia dados com o governo chinês. Mas alguns especialistas enxergam tentativa de barrar a China no mercado de big techs

Por Luccas Diaz
26 abr 2024, 19h00
Celular com aplicativo do TikTok aberto, com a bandeira da China ao fundo.
Legislação que determina venda do aplicativo nos EUA foi aprovada em tempo recorde  (Unsplash/Reprodução)
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“Trovão”: é assim que o projeto de lei acerca do banimento do TikTok nos Estados Unidos ficou conhecido no congresso estadunidense. O apelido surgiu em razão do tempo recorde em que ele foi aprovado entre as instâncias americanas: foram apenas três dias entre a aprovação da Câmara, no sábado (20), e a do Senado, na terça (23). No dia seguinte, quarta-feira (24), o projeto já era sancionado pelo presidente Joe Biden. A pressa pode surpreender, mas somente demonstra a intensidade do entrave que vem sendo armado entre EUA e China. 

A legislação aprovada afirma que a empresa responsável pelo TikTok, a chinesa ByteDance, tem 270 dias para vender a parte responsável por administrar o aplicativo em terras americanas. Há ainda a chance de prorrogar o prazo por mais 90 dias, totalizando um ano. O motivo seria a suposta coleta de dados que a chinesa promove de seus usuários. A preocupação é o compartilhamento desses dados com o governo chinês, onde Xi Jinping enxerga as empresas privadas como parceiras do Estado.

+ Por que o TikTok é o novo capítulo da guerra comercial EUA x China

Caso a ByteDance se recuse a cumprir a ordem, ou nenhuma estadunidense realize a compra – que sai por US$ 100 bilhões –, a rede social deverá ser retirada das lojas de aplicativos e de todos os “serviços de hospedagem de internet” dos EUA.

Para além da acusação do compartilhamento de dados com o governo chinês, o projeto de lei foi impulsionado por uma estratégia promovida pela Câmera dos Representantes dos EUA. O banimento do aplicativo foi incluído em um pacote maior de sanções relacionadas a adversários do país, incluindo não apenas a China, mas também a Rússia.

Dessa forma, a aprovação do projeto inclui o envio de auxílios militares à Ucrânia, Israel e Gaza. A medida foi um ponto-chave para conseguir os votos tanto dos republicanos quanto dos democratas: foram 360 a favor e apenas 58 contra.

Ainda no início da semana, Shou Chew, CEO da ByteDance, postou um vídeo (em inglês) na plataforma tranquilizando os usuários. No comunicado, afirma que a lei é “inconstitucional” e que o app, que tem 170 milhões de estadunidenses, não irá a lugar nenhum. Disse ainda que a aprovação da lei representaria um “atropelamento” da liberdade de expressão dos americanos, que encontram comunidade e conexão na plataforma. Nos EUA, segundo levantamento, pelo menos um terço da população abaixo de 30 anos utiliza a plataforma.

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TikTok: um softpower chinês?

O papel das redes sociais na disseminação de opiniões e ideologias está mais do que claro. Desde a última década, já com a Primavera Árabe, em 2011, foram vários os momentos de tensão política originados ou impulsionados nas redes. Tal histórico tem colocado os aplicativos na seara dos assuntos de segurança nacional não apenas nos EUA, mas em diversos países ao redor do mundo – incluindo o Brasil.

“Em termos de geopolítica, o principal motivo por trás da decisão dos EUA de considerar o banimento do TikTok é a crescente tensão e rivalidade tecnológica entre os EUA e a China”, explica Marcelo Crespo, especialista em direito digital e coordenador na ESPM. “O governo dos EUA vê a influência crescente da tecnologia chinesa, especialmente em plataformas amplamente utilizadas como o TikTok, como uma possível ameaça à segurança nacional e uma ferramenta de influência geopolítica por parte da China.”

Segundo as acusações americanas, a ByteDance estaria promovendo uma suposta parcialidade em relação aos conteúdos de maior visibilidade na plataforma chinesa. Vídeos relacionados a temas sensíveis ao governo chinês teriam menos destaque do que aqueles considerados sensíveis ao governo americano. Posts sobre Taiwan, que não tem sua autonomia reconhecida pela China, por exemplo, seriam menos frequentes na plataforma do que posts pró-Palestina, adversária de Israel, que é aliado dos EUA.

+ A Guerra Civil que deu origem às tensões entre China e Taiwan

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Para os EUA, o relacionamento entre a ByteDance e o governo chinês está evidente, com o compartilhamento de dados sendo usados não apenas para a espionagem dos usuários americanos, como também para a promoção de conteúdos contrários ao governo. O algoritmo do TikTok é conhecido por ser um dos mais precisos quando o assunto é entregar conteúdos de interesse ao usuário.

Em defesa, o app afirma que a frequência de posts que seriam contrários ao governo americano é meramente um reflexo dos interesses orgânicos dos usuários, e que em nada representam uma manipulação da plataforma.

A hegemonia dos EUA no mundo digital

Desde o momento em que os algoritmos foram introduzidos nas redes sociais, uma guerra em torno da coleta de dados dos usuários tem se intensificado. Escândalos como o papel do Facebook e da Cambridge Analytica nas eleições americanas de 2018 colocaram em xeque a transparência das políticas de privacidade dessas plataformas. Um dos marcos do caso foi o extenso depoimento de Mark Zuckerberg no congresso americano, em abril daquele ano.

Ainda assim, tanto Facebook, quanto outros aplicativos do conglomerado Meta, como Instagram e WhatsApp, continuam ativos no território americano.

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Ampliando o cenário, é possível observar que há, na verdade, uma dominância do cenário digital por um grupo de empresas que podem ser contadas nos dedos. São as chamadas big techs, como a própria Meta, o Google e a Apple. Todas americanas. Para alguns especialistas, a manobra dos EUA de banir o TikTok do país seria uma tentativa de barrar a China de adentrar esse mercado.

“A decisão de banir o TikTok aparentemente tem menos a ver com preocupações de privacidade e mais com a origem estrangeira da empresa e a rivalidade geopolítica com a China, sugerindo uma possível dualidade de critérios dependendo da nacionalidade da empresa”, opina Crespo.

Paralelamente, a China vem reforçando a sua barreira contra alguns aplicativos americanos no território. Por lá, é comum existir aplicativos semelhantes aos usados no Ocidente, mas especificamente projetados para o público chinês. Outros como Instagram, WhatsApp, X/Twitter e todos da plataforma Google (incluindo YouTube, Gmail) são proibidos e indisponíveis nas lojas de aplicativos.

+ O Dilema das Redes: 9 obras que também falam de perigos da tecnologia

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A ByteDance continua a afirmar que nunca compartilhou dados dos usuários americanos com o governo chinês, e que não faria mesmo se solicitada.

O cerco americano contra o TikTok começou já durante as eleições de Donald Trump, quando jovens de comunidades de fãs de K-Pop se organizavam na rede social para reservar acentos em comícios do republicado e não comparecer, deixando os eventos com um público abaixo do esperado. “Naquela época, o então presidente tentou forçar a venda das operações americanas do TikTok a empresas dos EUA, como a Microsoft, alegando preocupações semelhantes de segurança nacional”, explica o professor. O projeto, no entanto, foi logo barrado pela Câmara, que o considerou inconstitucional.

Curiosamente, Trump hoje se diz contra o banimento do TikTok. O ex-presidente enxerga a tentativa como uma forma de manter a soberania da Meta sobre as redes sociais, algo que julga incorreto, uma vez que crê que o Facebook boicotou sua campanha de reeleição.

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