Aprenda história lendo sobre futebol
Sabemos que não é todo mundo que gosta de história. Alguns alunos até se interessam, mas têm dificuldade com livros didáticos muito formais. Para mudar isso, que tal estudar a matéria de uma maneira diferente? Lendo sobre futebol, talvez?
É isso mesmo, no livro Como o Futebol Explica o Mundo, o jornalista americano Franklin Foer, um aficionado por futebol, explica eventos históricos usando acontecimentos ligados ao esporte mais popular do mundo. Confira a seguir alguns exemplos do livro.
A Reforma Protestante
Na Escócia, uma das maiores rivalidades do esporte é entre Glasgow Rangers, clube de origem protestante, e os Celtic, clube com raízes católicas. Para se ter uma noção do tamanho dessa competitividade – alguns defendem que é a maior rivalidade futebolística do mundo -, um dos gritos da torcida do Rangers é “estamos mergulhados até o joelho em seu sangue”. A música remete à Reforma Protestante e ao massacre conduzido pelos reformistas contra a minoria católica no país.
A Reforma Protestante foi um movimento religioso iniciado no século XVI por Martinho Lutero, um sacerdote que publicou 95 teses desafiando ensinamentos da Igreja Católica que ele considerava incoerentes com o que dizia a Bíblia. Lutero, com suas críticas ao comportamento dos papas e à corrupção da Igreja, influenciou um movimento que se espalhou pela Europa inteira e foi responsável pela morte de milhares de católicos durante o século XVI.
Na Escócia, os reformistas queriam eliminar totalmente a influência católica no país. Eles recusavam a veneração de santos, relíquias e figuras ornamentais e acreditavam na importância do trabalho e penitências como forma de salvação da alma. Extremamente fundamentalistas, os reformistas escoceses perseguiram e massacraram os católicos que se recusavam a se converter. Muitos desses católicos se reuniam clandestinamente para resistir à Reforma. Dessas reuniões surgiu o clube Celtic, venerado pela ala católica escocesa. Em outra região da cidade, os protestantes fundaram o Rangers, clube que não aceitava jogadores católicos até 1989.
O Irã
A Revolução Iraniana de 1979 tirou o “modernista” xá Reza Pahlevi do poder e, em seu lugar, subiu o fundamentalista religioso aiatolá Khomeini. Pahlevi era aliado dos norte-americanos e tentou fazer uma “revolução branca” no país, forçando reformas em uma nação pobre e praticando repressão política com a Savak, polícia que empregava censura e tortura aos opositores do regime. Tudo isso deixou Pahlevi bastante impopular no país, enquanto o movimento islâmico crescia.
Em 1979, Khomeini tomou o poder aclamado pelo público. Em pouco tempo, instaurou uma república islâmica com leis conservadoras e o controle político nas mãos do clero. As reformas da época de Pahlevi foram desfeitas e o Irã se afastou totalmente do ocidente e dos ideais ocidentais. Muita gente apoiou a tomada de poder dos aiatolás, mas, ao longo do processo revolucionário, leis rigorosas foram surgindo e todos os dissidentes eram duramente perseguidos e punidos.
E o futebol com isso?
Na época do regime de Pahlevi, o esporte se tornou um sinônimo de modernidade ocidental. Os melhores jogadores eram estrangeiros e, mesmo de outras religiões, festeiros e tatuados, eram idolatrados por iranianos – e pelo próprio xá, fã do time Taj, de Teerã. Quando o regime de Khomeini tomou posse, os aiatolás tentaram transformar o futebol em propaganda antiocidental, colocando cartazes contra os Estados Unidos e Israel nos estádios.
A tática dos religiosos não deu muito certo e até hoje o futebol é símbolo de resistência no Irã. Nos estádios, jovens podem pedir reformas e encontrar outros revolucionários, mulheres podem pedir maior participação, jogadores com estilos de vida condenados pelos aiatolás são venerados.
Desintegração da Iugoslávia
Com o fim da Guerra Fria e a morte do líder socialista Tito, marechal croata que lutou na Segunda Guerra Mundial e, depois, se tornou presidente da Iugoslávia, as seis repúblicas regionais (Eslovênia, Croácia, Bósnia e Herzegovina, Macedônica, Montenegro e Sérvia) e as duas províncias autônomas (Kosovo e Vojvodina) começaram a entrar em diversos conflitos.
A região se mantinha em unidade por conta do contexto da Guerra Fria e da ideologia do marechal Tito. Entretanto, quando essas duas coisas deixaram de existir, o colapso econômico e as diferenças étnicas e religiosas tomaram conta da Iugoslávia.
Em 1990, um clássico do futebol representava bem os conflitos pelos quais a região iria passar. O time Dínamo Zagreb, da separatista Croácia, recebeu o clube rival Estrela Vermelha, de Belgrado, na Sérvia, capital da Iugoslávia. Os torcedores estavam prontos para um protesto e a guerra começou nos estádios, onde o nacionalismo ficava à flor da pele.
Quando a briga de torcidas começou, as grades que separavam as duas nacionalidades haviam desaparecido: foram dissolvidas com ácido. Os croatas tinham guardado armas e pedras e os sérvios também vinham preparados. Para proteger os jogadores do Estrela Vermelha de um massacre, um helicóptero os retirou de campo.
O jornalista Foer chegou a conversar com membros da torcida organizada do Estrela Vermelha. Segundo eles, o chefe da torcida, o terrorista Arkan, recrutava torcedores violentos para atuar nas guerras nacionalistas como paramilitares. Ele ainda ameaçava jogadores de clubes opostos ao Estrela Vermelha e trazia atletas famosos para visitar os “soldados-torcedores” feridos.
Gostou das histórias? No livro de Foer elas estão mais detalhadas e ainda contam com entrevistas e relatos, em primeira pessoa, do jornalista, que viajou para todos os países citados na obra. Além das histórias citadas, há também informações de outros lugares, inclusive do Brasil. Vale a pena conferir!