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As faces do neonazismo na atualidade

Alguns termos da política são usados de maneira errada, como é o caso da confusão entre nazismo e neonazismo; entenda a diferença

Por Carla Mereles, do Politize!
18 out 2017, 17h24
As faces do neonazismo na atualidade
(Politize!/Politize!)

Alguns termos da política são usados de maneira errada – ou ao menos inapropriada. É o caso da confusão entre nazismo e neonazismo. Alguns casos avaliados como neonazistas aconteceram recentemente no mundo e uns pensam que o neonazismo é uma vertente atenuada do nazismo, mas não é bem por aí. Vamos compreender o que é o neonazismo?

O que é neonazismo?

O neonazismo é o resgate do nazismo na atualidade, mas com uma face repaginada, a fim de ter mais sintonia com a época atual. Continuam as ideias nazistas, como a do racismo, do nacionalismo, do antissemitismo e do anticomunismo.

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As faces do neonazismo na atualidade
Manifestação neonazista na cidade de Leipzig, na Alemanha, em outubro de 2006. (Sean Gallup/Getty Images)

Para os neonazistas, assim como no nazismo alemão, há apenas uma raça soberana: a “raça pura ariana”. Os principais alvos de discriminação são: comunistas, judeus, índios, negros e homossexuais. Da mesma maneira que vários tipos de preconceito se disseminam, como a xenofobia, ele tem causas em questões pelas quais certo país está passando, como desemprego, poucas oportunidades de trabalho, crescente criminalidade, entre vários outros contextos nacionais. Para eles, uma forma de combater esses problemas é depositar a culpa desses problemas na presença e cultura do outro no país, como imigrantes, refugiados, estrangeiros.

O grande diferencial do neonazismo é o uso de outra abordagem para a disseminação de suas ideias. Por exemplo, quando defendem suas ideias ao clamar por uma “salvação nacional”, considerando-se “libertadores” que valorizam a pátria e dela se orgulham. Esses são exemplos da utilização de palavras brandas, os famosos eufemismos, para maquiar a origem de seus ideais e ter a possibilidade de atrair mais pessoas, principalmente aquelas que já se identificam com ideais da extrema-direita. O discurso de “nós” contra “eles” é o mesmo, só está repaginado.

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O que foi o nazismo?

O nazismo é o nome de uma ideologia política disseminada amplamente pelo Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães, que foi criado em 1920 por Anton Drexler na Alemanha. Como muitos já sabem, essa ideologia logo se espalhou por toda a Alemanha sob o comando de Adolf Hitler, culminando num regime autoritário nazista, que foi a causa de vários marcos históricos, como o holocausto e a Segunda Guerra Mundial.

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Quais as características do neonazismo?

As características do neonazismo são as mesmas do nazismo, mas com uma abordagem nova e mais adaptada à atualidade. As origens são similares também: ambas as ideologias florescem em países, espaços e locais em que há alguma forma de conturbação social, seja o desemprego, a violência, a desigualdade social e dificuldade de vida em geral. O neonazismo se alastra em quem já tem um pensamento que caminha em direção à extrema direita.

O neonazismo tem como premissas a supremacia da raça branca – ou, como chamam, a “raça ariana” –, a anti-imigração – e consequente xenofobia –, o nacionalismo exacerbado, o anticomunismo, o anticatolicismo, o antissemitismo. Esses comportamentos são diretamente inspirados no nazismo. Outros, porém, fortaleceram-se apenas com surgimento do neonazismo. Vejamos:

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Os neonazistas são chamados de negacionistas. A maioria dos grupos neonazistas nega que o Holocausto existiu. O Holocausto foi o nome dado ao genocídio de judeus durante a Segunda Guerra Mundial, em que eles foram perseguidos e aprisionados em campos de extermínio pelo regime nazista. Nesses lugares, eram levados a câmaras de gás para morrerem por asfixia. Estima-se que 6 milhões de judeus morreram na Alemanha nazista. A estratégia de muitos grupos neonazista é de negar esse acontecimento, argumentando que não houve essa perseguição e que o número de judeus mortos durante a guerra não passou de 500 mil pessoas.

Não se intitulam como racistas, apesar de atitudes que corroborem essa prática. O discurso nazista e neonazista é essencialmente racista, tanto por acreditar em uma supremacia branca como por ser contra a entrada de outras pessoas – portanto, de outras culturas, outras ideias, outras vivências e visões de mundo – em seu espaço.

As faces do neonazismo na atualidade
Líder do Partido Nacional Socialista dos EUA fala com jornalistas, em 2005 (Lisa F. Mizelle/Getty Images)

Como o neonazismo se desenvolveu?

O nazismo não é uma ideia antiga, tampouco uma filosofia que foi expulsa do mundo após a Segunda Guerra Mundial. Muitas pessoas, e o próprio governo alemão, demonstraram vergonha do Holocausto e do nazismo depois da guerra. Criaram museus sobre a sua história e  monumentos para o Holocausto, transformaram os campos de concentração – como Auschwitz, o maior deles – em um lugar aberto para visitação e implementaram nas aulas de história formas de mostrar às novas gerações as consequências do nazismo, a fim de conscientizá-las.

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O neonazismo na Alemanha

No berço do nazismo, a Alemanha, entendeu-se que a educação seria também um meio de conscientização. Em 1991, a agência educacional de monitoramento do governo alemão pediu que o nazismo fosse total e ostensivamente tratado nas escolas, a fim de que a memória do Holocausto fosse mantida viva e de que o passado não se repetisse.

Sobre a visão da população alemã acerca do nazismo, o professor de ética comparada da Universidade Livre de Berlim, Markus Tiedemann, explica como os alemães encaram a história do nazismo em uma entrevista.

  • A esmagadora maioria da população alemã tem a explícita rejeição de todas as formas de fascismo e racismo e um compromisso com a história alemã, o Holocausto e a Segunda Guerra Mundial. Tem desejo de paz, tolerância e solidariedade internacional e agem com comprometimento em prol desses valores.
  • Uma segunda parte da população toma esses valores como garantidos, no sentido de não haver necessidade de relembrá-los o tempo todo – sobre solidariedade, paz e tolerância. Eles tendem a ignorar os perigos ou a encarar a miséria humana com horror e impotência.

Portanto, por mais que tenha havido educação extensiva no sistema educacional alemão, há dois resultados: de pessoas que reconhecem esses valores e pessoas que se comprometem com eles; nem todas serão ativas socialmente para disseminar valores contrários ao do nazismo, por exemplo. E é importante entender que, por ter sido o país em que o nazismo surgiu e se aflorou, a Alemanha não conseguiu extinguir o mal pela raiz. Diversas pessoas que seguiam a ideologia nazista continuaram no país, como trabalhadores comuns, artesãos, vendedores, médicos, advogados. Como explica o livro “Nazismo – como ele pôde acontecer”, da Superinteressante, essas pessoas inclusive voltaram a trabalhar no governo.

Exemplo disso foi um dos autores das leis de segregação racial durante o regime nazista, Hans Globke. Ele se tornou assessor do chanceler alemão nos anos 50, ou seja, estava de alguma forma a influenciar o governo. Uma das formas de manutenção e sobrevivência da ideologia nazista foi, então, a criação de grupos remodelados: os que conhecemos hoje como grupos neonazistas 

O neonazismo no mundo atual

Há alguns episódios de grupos neonazistas atuando política e socialmente no mundo. Sobre a sua atuação política, o neonazismo aparece na sua forma de ideologia. Veja alguns exemplos:

Socialmente, milícias e grupos neonazistas atuam ao redor do mundo. Para nomear dois deles, falamos do grupo Clandestinidade Nacional Socialista que atuou por anos na Alemanha, sendo autor de ataques por bombas que causaram mortes de oito pessoas. O Movimento de Resistência Finlandês, que atua na Finlândia, faz protestos contra a entrada de imigrantes e refugiados, atua de forma violenta e tem diversas acusações de agressão.

Charlottesville: a passeata de neonazistas nos EUA

O mais recente, comentado e visado caso de neonazismo explícito aconteceu em Charlottesville, uma cidade no estado de Virgínia, nos Estados Unidos. No dia 12 de agosto de 2017, centenas de pessoas foram às ruas dessa pequena cidade estadunidense de 50 mil habitantes para protestar. Contra o quê? Contra a presença de negros, homossexuais, imigrantes e judeus. Carregavam tochas, gritavam palavras de ordem e faziam saudações nazistas. Alguns se vestiam com armaduras e tinham cacetetes nas mãos.

A passeata neonazista reuniu centenas de pessoas que eram contra a retirada da estátua de um general confederado – que lutou pelo Sul na Guerra Civil dos Estados Unidos – chamado Robert E. Lee, pois o consideram um símbolo histórico de ideais como a supremacia branca. Os atos ocorreram principalmente na Universidade de Virgínia e causaram momentos de tensão e violência, principalmente com os grupos que faziam oposição aos extremistas de direita – como o grupo Black Lives Matter (a vida dos negros importa, em tradução literal para o português).

A BBC Brasil enviou o repórter Ricardo Senra para a cidade de Charlottesville e aqui estão algumas de suas impressões sobre o que ocorreu: “Os participantes do protesto desta sexta-feira carregavam bandeiras dos Confederados e gritavam palavras de ordem como: “Vocês não vão nos substituir”, em referência a imigrantes; “Vidas Brancas Importam”, em contraposição ao movimento negro Black Lives Matter; e “Morte aos Antifas”, abreviação de “antifascistas”, como são conhecidos grupos que se opõem a protestos neonazistas.”

Grupos neonazistas

Os grupos neonazistas existem em todo o mundo, estão espalhados por países como Alemanha, Espanha, Estados Unidos, Brasil e Uruguai. Alguns dos mais famosos definem sua principal pauta na “supremacia branca” – princípio de que pessoas de pele branca são superiores –, como a Nação Ariana, o White Power, os Skinheads, a Ku Klux Klan. Vamos falar sobre dois deles: os skinheads e a Ku Klux Klan.

Os Skinheads

Um grupo muito conhecido é o dos skinheads, formado nos anos 1960 na Inglaterra por jovens de classe média baixa que, originalmente, não promovia ideais racistas. Mas, na década seguinte, devido à recessão econômica e à fragilização da relação com imigrantes, o grupo se uniu ao partido neonazista inglês Frente Nacional – em inglês, National Front –, que promovia a superioridade branca. A partir de então, são diretamente associados a ideais neonazistas, fascistas e de extrema-direita.

Os skinheads ganharam mais notoriedade a partir dos anos 1980, com grupos nos Estados Unidos que praticavam vandalismo e violência contra grupos de pessoas negras, homossexuais, judeus e imigrantes latinos.

Ku Klux Klan

Outro grupo, também muito famoso historicamente, é a Ku Klux Klan, conhecida como KKK. A Ku Klux Klan foi um grupo secreto racista, chamado de clã, com ideais de extrema-direita. Prega o ultranacionalismo, a supremacia branca, a anti-imigração, o antissemitismo e tem um histórico de violência grande nos Estados Unidos. Esses ideais foram mais ou menos presentes nas três formas em que o clã se desenvolveu no país.

A Ku Klux Klan é também conhecida por suas vestimentas características: trajes brancos, como camisolas, chapéus pontiagudos em forma de cones, apesar com buracos para os olhos. Com essas roupas, buscavam assustar as pessoas e manter o anonimato de seus membros.

primeiro clã foi formado em 1866 por soldados veteranos que lutaram pelo sul dos Estados Unidos – historicamente um território racista, que queria a continuidade do escravismo – e foram derrotados na Guerra Civil Americana. Não há dados que confirmem quantas pessoas integraram esse clã. O grupo agiu com violência e intimidação contra os escravos libertos. Em 1882, a Suprema Corte declarou a existência da KKK como inconstitucional.

segundo clã passou a agir em 1920 tinha características principalmente antissemitas, xenofóbicas e nacionalistas. Opunham-se contra os judeus e defendiam a unidade do país, tinham um discurso de anti-imigração – havia uma onde de imigração vinda da Europa – e de conservação da identidade nacional. O grupo, que chegou a 4 milhões de membros, fazia grande oposição também à Igreja Católica, realizando passeatas em massa, com os mesmos trajes do primeiro clã e fazendo queima de cruzes.

terceiro clã surgiu em meados dos anos 1950, em diversos lugares nos Estados Unidos, como uma forma de se opor ao movimento dos direitos civis liderado por Martin Luther King, em busca do fim da segregação racial e do ódio contra os negros. Agiam de maneira independente e radicalizada: faziam linchamentos e praticavam terrorismo contra a população negra, inclusive por meio de ataques por bombas. Devido à violência de seus ataques, o próprio governo estadunidense se viu obrigado a assinar a Declaração dos Direitos Civis – que previa a igualdade racial – em 1964 e foi revivido um ato que proibia a ação da KKK no país.

Os dois grupos apresentados não são apenas grupos de extrema-direita, mas sim grupos que se relacionam diretamente com ideais nazistas, caracterizando-se pelo neonazismo. Casos como o de Charlottesville, que pregam intolerância, ódio e preconceito têm sido recorrentes no mundo. Devemos nos educar, entender esses ideais, suas origens e como se manifestam no mundo atual.

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