A máquina de fax era o que permitia a Ervin Rustemagić manter contato com o restante do mundo nas tentativas de mobilizar ajuda ou para relatar o cotidiano de um conflito que parecia não ter fm.
O cerco à capital Sarajevo em 1992, episódio que dá início à Guerra da Bósnia, altera completamente a vida do editor de histórias em quadrinhos de origem bósnio-muçulmana. Após terem destruído sua casa e o estúdio que servia de abrigo a ele, Ervin e sua família passam a conviver com o medo e a insegurança, sob o barulho constante das explosões de granadas sérvias.
A “limpeza étnica” promovida pelos sérvios era implacável. O simples ato de sair à rua poderia ser fatal, dada a quantidade de bombardeios diários e de franco-atiradores posicionados no alto dos prédios, remunerados conforme o número de pessoas que matavam. Casas eram saqueadas e destruídas, mulheres eram tomadas como prisioneiras sexuais e execuções em massa se tornavam cada vez mais frequentes.
A falta de eletricidade ou de linhas telefônicas somava-se à escassez de água e comida. Os comboios sérvios controlavam as fronteiras, impedindo que qualquer pessoa não autorizada deixasse a cidade. No entanto, ficar em Sarajevo por mais tempo significava aguardar uma morte trágica e iminente.
Os 18 meses em que a família Rustemagić viveu de perto o horror da guerra são descritos com detalhes nas mensagens enviadas por Ervin por meio dos antigos aparelhos de fac-símiles (fax), que transformam desenhos e textos em papel em imagens enviadas por linha telefônica. Destinadas a amigos da indústria editorial de várias partes do mundo, suas mensagens retratam as tentativas da família de deixar o país.
Coube ao quadrinista norte-americano Joe Kubert, amigo pessoal de Ervin e destinatário de boa parte dos fax, reunir e interpretar o material utilizado para a criação de Fax de Sarajevo. Kubert possui carreira relevante como desenhista de quadrinhos, colaborando em empresas como a DC Comics e a Marvel.
A opção do autor pelo formato de HQ confere à história maior dinamismo, personifica o terror do conflito nas expressões dos personagens e nas cenas de uma Sarajevo arrasada pela guerra. Colocados na íntegra ao longo da história, os fax conduzem a narrativa, estabelecendo uma espécie de diário de guerra.
Apesar de ter ganhado versão nacional apenas em 2016, a obra foi originalmente publicada em 1996, e venceu importantes prêmios internacionais de quadrinhos, como o Eisner e Harvey Awards, dos Estados Unidos, e o do Festival de Angoulême, na França.
A Guerra da Bósnia completa, em 2017, 25 anos de seu início. Foi o mais sangrento conflito armado na Europa desde a II Guerra Mundial.
FAX DE SARAJEVO
Autor: Joe Kubert
Editora Quadrinhos Via Leitura , 208 páginas.