De olho na História: A Doutrina Truman
A GUERRA FRIA COMEÇA AQUI
Com a Doutrina Truman e o Plano Marshall, os Estados Unidos lançaram os pilares de contenção à expansão comunista liderada pela União Soviética
RECONSTRUÇÃO. Berlim Ocidental, 1948. O cartaz diz: “Programa de Emergência de Berlim: Com a Ajuda do Plano Marshall”
Nos primeiros meses de 1945, quando a II Guerra Mundial caminhava para o seu final diante de uma Alemanha praticamente derrotada, ficou evidente que uma nova correlação internacional de forças estava sendo formada. Afinal, a divisão do mundo entre os aliados – Estados Unidos (EUA), União Soviética (URSS), Reino Unido e França – e o Eixo – Alemanha, Itália e Japão – já estava ultrapassada.
Com a Europa devastada pelo conflito, EUA e URSS despontavam como as novas superpotências. Se durante a II Guerra os dois países estabeleceram uma aliança de conveniência para deter o nazifascismo, com o fim do conflito essa cooperação foi logo desfeita. As Conferências de Ialta, em fevereiro de 1945, e de Potsdam, entre julho e agosto de 1945, realizadas ainda durante a guerra, confirmaram o estabelecimento das zonas de influência de dois blocos distintos: de um lado, os EUA lideravam o mundo ocidental sob a égide do capitalismo; do outro, a URSS expandia a Revolução Comunista para o leste europeu. Essa nova ordem mundial foi colocada em prática na derrotada Alemanha, fatiada em quatro zonas de ocupação, controladas por EUA, URSS, França e Reino Unido. Sob esse caldo de profundas diferenças ideológicas, uma nova rivalidade começava a surgir.
A Doutrina Truman
O primeiro-ministro britânico Winston Churchill cunhou o termo “cortina de ferro” para definir a separação da Europa entre os hemisférios capitalista e socialista. Essa virtual barreira metálica, que dividiu o mundo por mais de quatro décadas, foi logo se fortalecendo com a expansão soviética, que capturara e executara lideranças na Polônia e estabelecera uma ditadura comunista na Romênia. Para os EUA, estava evidente que a expansão do comunismo no continente europeu deveria ser combatida.
Em 1947, quando os governos da Turquia e da Grécia enfrentavam levantes comunistas que ameaçavam lançar os dois países para os braços da URSS, os EUA viram que era o momento de agir. Principalmente porque o Reino Unido, em dificuldades para se recuperar economicamente após a guerra, parou de financiar os Exércitos turco e grego. Foi nesse vácuo de poder que o governo do presidente norte-americano Harry Truman forneceu à Turquia e à Grécia um pacote de 400 milhões de dólares para financiar o estabelecimento de governos alinhados aos interesses ocidentais. No dia 12 de março de 1947, Truman fez um duro discurso contra a ameaça soviética e anunciou as bases de uma política externa mais agressiva, que exigia a intervenção norte-americana nessa nova ordem guiada pelo antagonismo entre os mundos capitalista e comunista. Estava lançada a Doutrina Truman.
O Plano Marshall
A derrota dos comunistas na Grécia e na Turquia reforçou a percepção de Truman sobre a necessidade de uma atuação mais assertiva para sustentar sua influência mundial. A maioria dos países da Europa Ocidental enfrentava dificuldades para reerguer-se economicamente após a guerra, o que, na visão norte-americana, criava uma brecha para o avanço do comunismo. Foi esse cenário que motivou os EUA a injetar uma ajuda financeira para estimular as cambaleantes economias europeias.
Em julho de 1947, o general George Marshall, secretário de Estado dos EUA, lançava o Programa de Recuperação Europeia, que ficou conhecido como Plano Marshall. Entre 1948 e 1952, os EUA forneceram cerca de 13 bilhões de dólares – o equivalente hoje a 100 bilhões de dólares – a países como Reino Unido, França, Itália, Alemanha, Bélgica e Holanda. Com esse dinheiro, os países conseguiram reerguer a infraestrutura devastada pela guerra, estimular a indústria e gerar empregos.
Se o auxílio financeiro foi essencial para que os adeptos do Plano Marshall recuperassem seu poder econômico, para os EUA essa política trouxe enormes vantagens no longo prazo. Em uma dispendiosa, mas certeira, tacada, Truman barrou a expansão comunista na Europa, consolidou sua influência na região e alavancou as exportações de produtos norte-americanos para essas nações.
O Plano Marshall consolidou a influência dos EUA na Europa Ocidental e barrou a expansão comunista
Otan e Pacto de Varsóvia
A Doutrina Truman e o Plano Marshall praticamente inauguraram a Guerra Fria. A expressão se referia às tensas relações entre EUA e URSS, que eram baseadas na busca permanente pela manutenção e expansão das respectivas áreas de influência. Esse antagonismo foi reforçado com a criação da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), em 1949, a aliança militar entre os EUA e a Europa Ocidental. Seis anos depois, a URSS e o Leste Europeu responderam com o Pacto de Varsóvia, a aliança militar comunista.
Como os dois lados dessa trincheira possuíam arsenal nuclear, um confronto militar direto foi evitado. Mas a Guerra Fria se caracterizou pelos diversos conflitos indiretos envolvendo EUA e URSS. O primeiro grande confronto desse tipo foi na Guerra da Coreia (1950-1953), quando a Coreia do Norte, comunista, invadiu a Coreia do Sul. A partir daí, episódios como a Revolução Cubana (1959) e a Guerra do Vietnã (1959-1975) ditaram o tom de um período polarizado e sombrio, que sempre esteve à beira de um conflito militar generalizado. Essa sensação só começou a ser desfeita com a queda do Muro de Berlim (1989) e o fim da União Soviética (1991), eventos que selaram o fim da Guerra Fria.