Gêneros textuais: Reveja as características de cada texto
Com exemplos sobre as lutas das mulheres e o feminismo
As dissertações continuam a ser o gênero de texto dominante nas provas, porém não o único. O levantamento anual do GUIA DO ESTUDANTE PROFISSÕES VESTIBULAR 2017, que abrange todas as faculdades e cursos do país, revela que 40 universidades públicas, estaduais e federais, ainda possuem provas próprias de redação, e algumas delas não pedem mais apenas dissertação. São os casos, por exemplo, da Universidade de Campinas (Unicamp) e da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). São gêneros como a narração e a crônica, a carta, o discurso, o comentário, o manifesto, o artigo de opinião. Vários desses gêneros trazem as mesmas exigências da dissertação argumentativa. Esses gêneros permitem às bancas uma avaliação mais abrangente dos níveis de expressão do candidato. Os diferentes gêneros textuais invadiram as coletâneas para as redações e é importante reconhecê-los. Em todos os casos, é fundamental que você saiba situar socialmente o seu texto: onde estou, para quem escrevo, como me dirijo a esse interlocutor, ou interlocutores, qual a formalização necessária?
TIPOS TEXTUAIS
1- NARRAÇÃO
O texto narrativo é aquele que conta uma história, fatos que envolvem personagens em um contexto. O autor pode seguir alguns passos básicos: descrever determinada situação ou ambiente, apresentar um ou mais personagens, introduzir um fato ou acontecimento que os envolva ou afete nesse ambiente ou situação e pôr um desfecho para a história. O narrador pode escolher se participa ou não da ação, escrevendo em primeira pessoa do singular ou do plural. Não é necessário seguir uma ordem cronológica, mas é importante que a narrativa apresente coerência e uma linguagem envolvente. É um gênero por excelência literário. Confira um excerto de narrativa, em reportagem sobre manifestação no Dia Internacional da Mulher, em São Paulo.
DEFESA DE LULA E DILMA PROVOCA RACHA E BRIGAS EM MARCHA DAS MULHERES
Por Ricardo Galhardo
(…) Segundo organizadoras do evento, a pauta petista não foi negociada com os demais grupos que chamaram o ato. (…)
O clima esquentou quando Silvia Ferraro, do PSTU, tomou o microfone e fez um discurso contra o governo. “Fora, Dilma, fora, Temer, fora, Aécio, fora, Cunha, fora, Renan, fora, Alckmin”, disse Silvia. O discurso foi o estopim para o início da confusão. Defensoras de Dilma tentaram tomar o microfone da militante do PSTU, e Silvia resistiu. As agressões começaram ainda em cima do carro de som e logo se espalharam para a rua, onde defensoras dos dois lados começaram a trocar empurrões, tapas e xingamentos como “vagabunda”, “cachorra” e “bandida”. Silvia precisou de uma escolta para conseguir deixar o carro de som. (…) Em represália, o grupo ligado ao PSTU decidiu marchar em direção oposta, rumo ao bairro Paraíso, enquanto a passeata seguia para a Rua da Consolação.
O Estado de S. Paulo online, 8/3/2016
2- DISSERTAÇÃO
É o tipo de texto mais solicitado nas provas. Trata-se de expor uma ideia, um problema ou um questionamento, desenvolver um raciocínio com base em argumentos e apresentar uma consideração final. É importante que o candidato saiba problematizar o tema, colocar argumentos favoráveis e contrários para fundamentar cada afirmação.
Na dissertação, quem escreve quer persuadir o leitor acerca da opinião que defende e que deve ser explicitada em uma conclusão final. Essa conclusão não precisa fechar a questão, como quem encontra uma solução para os problemas do mundo: se o assunto é complexo, a conclusão pode ser a afirmação dessa complexidade. Não faça uma pergunta sem ao menos problematizá-la. A dissertação pede o uso da norma-padrão da língua, ideias desenvolvidas de forma clara e objetiva e boa paragrafação. Espera-se um texto impessoal. Evite o texto em primeira pessoa. Isso não é proibido, mas é arriscado, pois é mais adequado ao gênero crônica ou ao tipo narração. Veja o exemplo de um trecho de dissertação argumentativa utilizado pelo escritor Antonio Prata.
#PRIMEIROASSEDIO
Ninguém sabe ao certo quantas mulheres são estupradas, todos os anos, no Brasil. (…) O problema é que só uma pequena parcela das vítimas desse crime busca a polícia: estudo do Ipea (goo.gl/4s4OGB) estima que em 2013 aconteceram, na verdade, 527 mil estupros. Também de acordo com o Ipea, 70% das vítimas são crianças e adolescentes. Mais da metade tem menos de 13 anos. Mais de dois terços dos agressores são familiares, amigos ou conhecidos das vítimas.
Um crime de tal forma disseminado em nossa sociedade não se perpetuaria impune e silencioso sem o machismo amplo, geral e irrestrito que reina por estes costados. (…)
Folha de S.Paulo, 1/11/2015
GÊNEROS TEXTUAIS
ESTILOS JORNALÍSTICOS
Reportagens, editoriais e artigos são os principais gêneros de texto jornalístico, cada um com suas características. Em um jornal ou revista, a reportagem se destaca dos demais gêneros: a reportagem procura trazer um discurso objetivo, narrativo, descritivo e não opinativo, enquanto os outros dois são textos opinativos. A boa reportagem apresenta informações objetivas, faz um relato da notícia que não inclui a opinião de quem escreve. O artigo assinado traz a opinião de um autor e pode ser escrito em primeira pessoa, e o editorial exprime a posição e opinião do jornal, que não permite a primeira pessoa. Tanto no artigo quanto no editorial, as informações são introduzidas para embasar um ou mais argumentos que procuram convencer o leitor.
O gênero crônica não apresenta distinções significativas em relação à crônica literária. Veja exemplos publicados na imprensa sobre as lutas femininas em 2015 e 2016.
REPORTAGEM
CÂMARA APROVA PROJETO QUE DIFICULTA ABORTO LEGAL E PUNE VENDA DE ABORTIVOS
Por Débora Álvares e Natália Cancian, de Brasília
A CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara aprovou por ampla maioria na tarde desta quarta-feira (21) um projeto de lei de autoria do presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que estabelece penas específicas para quem induzir ou orientar gestantes ao aborto. Na prática, o projeto também dificulta o acesso ao aborto legal.
O texto altera o Código Penal com a justificativa de “dotar o sistema jurídico pátrio de mecanismos mais efetivos para refrear a prática do aborto, que vem sendo perpetrada sob os auspícios de artimanhas jurídicas, em desrespeito da vontade amplamente majoritária do povo brasileiro”.
A proposta ainda precisa ser avalizada pelo plenário da Casa e tramitar no Senado.
Folha de S.Paulo online, 21/10/2015
LONGA CAMINHADA RUMO À IGUALDADE
por Lisandra Matias
As provas do Enem 2015 ganharam repercussão e viraram até polêmica nas redes sociais ao trazer duas questões relacionadas à situação da mulher. (…) As questões abordadas no exame não poderiam ser mais oportunas, já que 2015 foi um ano marcado por vários fatos e manifestações relacionados à defesa dos direitos das mulheres, como a aprovação da lei do feminicídio pela presidente Dilma Roussef, as campanhas que denunciaram assédio sexual na internet, os protestos contra o projeto de lei que restringe e dificulta o aborto legal e as declarações públicas de personalidades a favor da igualdade de gêneros. (…)
GUIA DO ESTUDANTE ATUALIDADES VESTIBULAR + ENEM
1º Semestre de 2016
ARTIGO DE OPINIÃO
O QUE QUEREM AS CATÓLICAS PELO DIREITO DE DECIDIR?
Por Regina Soares Jurkewicz (coordenadora)
Hoje no Brasil, as católicas não são somente um grupo de mulheres. Somos, sobretudo, uma corrente de pensamento, presente em quase todos os estados brasileiros, e teimosamente afirmamos, há mais de 20 anos neste país, que é possível ser católicas e feministas ao mesmo tempo. Estamos articuladas com o movimento de mulheres, somos parte desse movimento, e simultaneamente expandimos uma voz católica que entende a sexualidade humana como algo bom, como fonte de vida para todos. Trabalhamos com o pensamento teológico da própria Igreja Católica e, a partir daí, enriquecemos nossa argumentação em favor dos direitos sexuais e reprodutivos de homens e mulheres. (…)
Revista Geni, março de 2015, republicado por Católicas pelo Direito de Decidir
DEPOIMENTO/NARRATIVA
20 RELATOS DA HASHTAG #MEUAMIGOSECRETO QUE PRECISAM SER LIDOS
Por Isabella Moreira
#“meuamigosecreto” diz que “não tem preconceito e cada um faz o que quer”. Mas acha errado mulher casada sair à noite sozinha com os amigos, e egoísmo a prioridade da mulher (neste momento) ser a vida profissional. Acha um absurdo o homem limpar a casa e cozinhar. Defende que tem atividades domésticas que só a mulher pode fazer, pois é ela quem “dá o toque especial”. Fica me perguntando o tempo todo quando vou ter filhos, “pq já tá passando da hora”, e se meu marido não se incomoda de eu trabalhar tanto, estudar todo o final de semana, ter amigos homens e quase não ter tempo. Meu amigo-secreto não tem preconceito, nem é machista, só me acha muito moderninha!
Depoimento selecionado, Revista Galileu online, 25/11/2015
CRÔNICA
Gênero literário que é também utilizado por articulistas da imprensa. Assim como o conto, é um gênero por excelência narrativo, que aborda situações ou fatos do cotidiano. É mais coloquial que o dissertativo, mas não dispensa a norma padrão da língua. Veja um excerto.
O LAMPEJO FEMINISTA
Por Joanna Burigo
Morro de vergonha, mas confesso que já falei “eu não sou feminista, sou feminina”. Isso era quando eu não entendia o que era feminismo, e ainda achava que feminilidade era algo obrigatório e necessariamente positivo (não é obrigatório, e também não é necessariamente negativo, mas essa é outra conversa).
Quando eu era jovem, feminismo era uma palavra muito feia. Quando virei feminista, há uns bons dez anos, a palavra ainda era muito mal vista. Mas recentemente meu coração, que andava cansado de tentar explicar para as pessoas que feminismo é nada mais nada menos do que uma luta por justiça social pautada em gênero, anda cantando de emoção com tanto feminismo acontecendo pela internet. Eu imagino que esses últimos meses de 2015 venham sendo o #lampejofeminista de muita gente.
Revista CartaCapital, 23/2/2016
MANIFESTO
Um gênero de natureza dissertativa, de exposição de ideias e proposições de uma pessoa ou de um grupo. Em sua interlocução, o manifesto é público, com fins e propósitos determinados e, quando dirigido ao conjunto da sociedade, pode não trazer um vocativo de endereçamento.
Assim como a dissertação, um manifesto deve ter um título, desenvolvimento dos temas abordados, argumentação bem fundamentada e defesa de um ou mais pontos de vista. Exige assinatura, local e data de sua divulgação. O manifesto assemelha-se à carta-aberta, solicitada em 2015 pela Universidade de Campinas.
VAI TER SHORTINHO, SIM
Nós, alunas do Ensino Fundamental e Médio do Colégio Anchieta de Porto Alegre, fazemos uma exigência urgente à direção. Exigimos que a instituição deixe no passado o machismo, a objetificação e sexualização dos corpos das alunas; exigimos que deixe no passado a mentalidade de que cabe às mulheres a prevenção de assédios, abusos e estupros; exigimos que, ao invés de ditar o que as meninas podem vestir, ditem o respeito.
Regras de vestuário reforçam a ideia de que meninas têm que “se cobrir” porque garotos serão garotos; reforçam a ideia de que assediar é da natureza do homem e que é responsabilidade das mulheres evitar esse tipo de humilhação; reforçam a ideia de que as roupas de uma mulher definem seu respeito próprio e seu valor. (…)
Quando você interrompe a aula de uma menina para forçá-la a mudar de roupa ou mandá-la para casa por que o short dela é “muito curto”, você está dizendo que garantir que os meninos tenham um ambiente de aprendizagem livre de “distrações” é mais importante do que garantir a educação dela.
Ao invés de humilhar meninas pelos seus corpos, ensinem os meninos que elas não são objetos sexuais. Ao invés de ensinar que a minha decência e o meu valor dependem do comprimento do meu short ou do tamanho do meu decote, ensine aos homens que eu sou a única responsável pela definição da minha decência e do meu valor. Ensine aos homens o respeito, desconstrua o pensamento de que a roupa de uma mulher decreta se ela é ou não merecedora de respeito.
Nós, alunas do Ensino Fundamental e Médio do Colégio Anchieta, nos recusamos a obedecer a regras que reforçam e perpetuam o machismo, a cultura do estupro e slut-shaming.
Porto Alegre, fevereiro de 2016.
Este abaixo-assinado será entregue para: Coordenadores e Diretores Colégio Anchieta Disponível em https://www.change.org/p/col%C3%A9gio-anchieta-vai-ter-shortinho-sim
VERBETE/SÍNTESE
É o texto que define uma palavra, conceito, tema ou assunto, de forma estrita, objetiva, como em dicionários, enciclopédias. Na popular Wikipedia, embora pouco formalizados ou rigorosos, os verbetes compõem os artigos. O gênero foi solicitado na prova de 2012 da Unicamp.
MACHISMO [DE MACHO + -ISMO.] SUBSTANTIVO MASCULINO.
1. Atitude ou comportamento de quem não aceita a igualdade de direitos para o homem e a mulher, sendo contrário, pois, ao feminismo (q.v.).
2. Bras. Pop. Qualidade, ação ou modos de macho (3 Homem, e 4, valentão); macheza, machidão.
FEMINISMO [DO FRANCÊS. FÉMINISME.] SUBSTANTIVO MASCULINO.
Movimento daqueles que preconizam a ampliação legal dos direitos civis e políticos da mulher, ou a equiparação dos seus direitos aos do homem.
Novo Dicionário Aurélio [Buarque de Holanda], Editora Guanabara Koogan Ltda.