Internacional: Guerra Civil Espanhola Há 80 anos começava o sangrento conflito que antecipou a II Guerra Mundial
FOGO CERRADO A resistência republicana em combate na cidade de Toledo, nos primeiros dias da Guerra Civil Espanhola, em 1936
Prelúdio sangrento
Há 80 anos começava a Guerra Civil Espanhola, o conflito que antecipou os horrores da II Guerra
A Espanha dos anos 1930 era um caldeirão em ebulição. Sem conseguir superar uma grave crise econômica decorrente da quebra da bolsa de Nova York, em 1929, o país era tomado por greves e violentas manifestações. O cenário de convulsão social era alimentado pelas divergências entre as principais forças políticas do país. De um lado, trabalhadores rurais, operários e intelectuais exigiam mudanças sociais profundas, como reforma agrária, autonomia regional e redução dos poderes da Igreja Católica e das Forças Armadas. De outro, a classe dominante formada por proprietários de terras, empresários, monarquistas e líderes militares e católicos não aceitava as mudanças.
A polarização social atingiu seu ponto crítico nas eleições de 1936. A Frente Popular, formada por socialistas, anarquistas e trabalhadores que pressionavam por reformas, saiu vitoriosa da votação. Derrotada, a Frente Nacionalista, composta por conservadores de ideias fascistas, temia a implantação de um governo socialista que pudesse colocar em marcha as reformas que contrariavam a ultradireita.
Para evitar o avanço dessas propostas, os nacionalistas, com a ajuda dos setores mais conservadores do Exército, arquitetaram um golpe militar para derrubar o governo legalmente constituído. A resistência dos chamados republicanos, os simpatizantes da Frente Popular, evitou a queda imediata do governo. A essa altura o país já estava mergulhado em um confito generalizado – começava a Guerra Civil Espanhola.
Nazifascismo e comunismo
O golpe teve início no dia 17 de julho de 1936. A revolta do Exército contra o governo foi liderada pelo general Francisco Franco, que estava nas possessões espanholas do Marrocos. Em poucos dias, os nacionalistas tomaram várias regiões, como Navarra, Castillha e Galícia, a maioria concentrada em áreas agrícolas. Já as zonas de controle
republicano estavam concentradas nas regiões mais industrializadas e urbanas, como Madri e Barcelona.
As tropas do general Francisco Franco tiveram a ajuda da Alemanha nazista e da Itália fascista
Apesar de se tratar de um confronto local, envolvendo a disputa de poder na Espanha, a guerra logo ganhou contornos internacionais. Os nacionalistas obtiveram apoio dos governos nazista da Alemanha e fascista da Itália, que enviaram soldados, armas e munições para ajudar as tropas do general Franco. Já os republicanos contaram com a ajuda do governo comunista da União Soviética (URSS), que organizou as chamadas Brigadas Internacionais, compostas por 25 mil combatentes voluntários de 53 países. Apesar de apoiar os republicanos, Reino Unido e França decidiram não intervir diretamente no confito.
Mas enquanto os nacionalistas tinham a maior parte do Exército lutando a seu favor e formavam uma frente de combate mais unifcada sob o comando de Franco, os republicanos não dispunham de armamentos sufcientes e enfrentavam dissidências internas. Essas divergências atingiram o ápice em maio de 1937, quando grupos de esquerda, incluindo anarquistas, marxistas e o Partido Comunista, se enfrentaram em Barcelona, em confrontos que deixaram 500 mortos.
Guernica
A disputa fratricida acabou enfraquecendo ainda mais os republicanos na luta contra os nacionalistas. As tropas de Franco foram, gradualmente, conquistando territórios de norte a sul do país. Em um dos episódios mais emblemáticos e brutais da Guerra Civil, no dia 26 de abril de 1937 os nacionalistas empreenderam um violento bombardeio aéreo sobre o vilarejo de Guernica, onde viviam apenas 6 mil habitantes.
Localizado em uma das províncias do País Basco, região no norte da Espanha que havia assinado um tratado de autonomia regional com o governo republicano, Guernica acabou sendo vítima de retaliação por parte de Franco – tratava-se de um aviso para outras regiões que tentassem obter autonomia. O ataque foi realizado pela Força Aérea Alemã, em uma operação que serviu para Adolf Hitler testar seu arsenal em um período em que a tensão antes da Segunda Guerra Mundial ganhava corpo.
O bombardeio a Guernica deixou 1.654 mortos e 889 feridos. O horror vivenciado pelas vítimas foi registrado por Pablo Picasso em sua célebre pintura Guernica. Vivendo exilado na França, o pintor decidiu exprimir toda sua indignação pelos acontecimentos da Guerra Civil Espanhola em um amplo painel carregado de tons soturnos e expressões de desespero. É considerada uma das pinturas mais icônicas do século XX.
Vitória nacionalista
Quando a guerra adentrou em seu segundo ano, já estava claro que o avanço nacionalista não podia mais ser contido. Em fevereiro de 1939, as tropas de Franco ocuparam Barcelona e, no mês seguinte, Madri foi conquistada sem resistência. A tomada da capital pelos nacionalistas marca o fm da república e o surgimento de um Estado autoritário na Espanha. Em 1o de outubro, o general Franco é nomeado chefe de Estado e passa a governar o país com poderes ditatoriais por quase 40 anos, até a sua morte, em 1975 – esse período fcou conhecido como franquismo.
É difícil precisar o número de vítimas decorrentes da Guerra Civil Espanhola – as estimativas mais recentes apontam para cerca de 500 mil mortos. Devido à polarização entre comunistas e fascistas e o envolvimento direto de Itália e Alemanha, que utilizaram o território espanhol para testar armamentos e táticas bélicas, a Guerra Civil Espanhola é considerada uma espécie de ensaio para o maior confito da história: a II Guerra Mundial, que começaria em setembro de 1939, poucos meses após a vitória de Franco na Espanha.
Para ir além Baseado no livro Lutando na Espanha, de George Orwell, o filme Terra e Liberdade (de Ken Loach, 1995) retrata a história de um jovem desempregado inglês. Ele se junta ao Partido Comunista e decide partir para a Espanha lutar contra as tropas fascistas do general Franco.