MICHEL FOUCAULT
O pensamento de Foucault transita por diversos temas, como loucura, sexualidade, disciplina, poder e punição
Michel Foucault
ORIGEM
Poitiers (França) (1926-1984)
CORRENTE FILOSÓFICA
Pós-Modernismo
PRINCIPAIS OBRAS
História da Loucura; O Nascimento da Clínica; As Palavras e as Coisas; Vigiar e Punir; História da Sexualidade
FRASE SÍNTESE
“Nossa sociedade não é de espetáculos, mas de vigilância.”
BIOGRAFIA
Michel Foucault nasceu no dia 15 de outubro de 1926, em Poitiers, na França. Seu pai era um cirurgião renomado, lecionava na faculdade de medicina local e dirigia uma clínica bem-sucedida. O jovem Foucault, desde cedo, recusou-se a seguir a tradição familiar, negando a medicina. Sua vida foi marcada pela genialidade filosófica e também pelas “extravagâncias”, como suas experiências no sanatório, o uso de drogas diversas, a bebida excessiva e as tentativas de suicídio. Os dois maiores amores de sua vida foram um compositor chamado Jean Barraqué e Daniel Defert, filósofo e ativista político, que permaneceu ao lado de Foucault por quase 20 anos, numa relação aberta. Especialmente depois de lecionar na Universidade da Tunísia, Foucault tornou-se ativo politicamente, chegando a entrar no Partido Comunista Francês (PCF). Morreu no dia 25 de junho de 1984, vítima da aids.
“A constituição da loucura como doença mental, no fim do século XVIII, delineia a constatação de um diálogo rompido entre loucura e não loucura, entre razão e não razão. A linguagem da psiquiatria, que é um monólogo da razão sobre a loucura, só pôde estabelecer-se sobre um tal silêncio.”
A FILOSOFIA DE FOUCAULT
Foucault tratou de temas como loucura, sexualidade, disciplina, poder e punição, hoje vistos em várias áreas do conhecimento. Em História da Loucura, ele procura mostrar como o conceito de loucura mudou através dos tempos. Uma de suas ideias fundamentais é que a loucura não é algo da “natureza” ou uma “doença”, como acreditavam os psiquiatras, mas um “fato de cultura”. Podemos enxergar quatro momentos na história da loucura:
– Na Idade Média, os loucos vagavam livres pela sociedade e eram, em muitos casos, considerados sagrados.
– No Renascimento, a loucura é vista como “uma das formas da razão”, ou seja, um saber fechado, esotérico, que produz e manifesta a realidade de outro mundo e nos entrega o homem essencial, que em sua natureza íntima é furor e paixão.
– Foucault chama o período entre os séculos XVI e XVII de Idade Clássica, que teve Descartes como fundador da filosofia moderna. A partir da dúvida sistemática, Descartes chegou ao que acreditava ser a Verdade e identificou a loucura como algo que nos leva ao erro. Assim, separa-se o que é “racional e verdadeiro” do que é “errôneo e falso”. A loucura passa a ser silenciada do ponto de vista filosófico e internada do ponto de vista institucional: “A loucura foi colocada fora do domínio no qual o sujeito detém seus direitos à verdade”.
– No fim da Idade Clássica, reformistas começaram a ver esse confinamento do louco como uma barbárie, pois a loucura não era um “crime”, mas uma “doença”. Cria-se o mito de que há um “homem normal”, anterior à doença, e, em contrapartida, define-se o “louco” como um “doente”, que estaria distante da normalidade. A partir desse momento, os loucos foram liberados do encarceramento e postos sob cuidados médicos. O “louco” torna-se, ainda, um objeto de estudo.
Foucault mostrou que a atuação do médico sobre o louco só foi possível devido à mudança filosófica do século XVII. Em outras palavras, a atuação do médico sobre o louco depende menos de seu conhecimento sobre medicina do que de sua cultura.
Foucault também reflete sobre o sistema penal e a filosofia do poder, que aparecem amalgamados em Vigiar e Punir: História da Violência nas Prisões. O objetivo do livro era pensar toda a “tecnologia do poder”, que teria surgido no século XVIII. Para o filósofo, o domínio no qual se exerce o poder não é a lei, mas, sim, a norma, que produz condutas, gestos e o próprio indivíduo moderno.
Para regular a vida dos indivíduos existe o “poder disciplinar”, empregado em hospitais, escolas, fábricas e prisões. Para explicar essa nova forma de disciplina e vigilância, Foucault cita o clássico exemplo do Panóptico (literalmente, “vê-se tudo”) para prisões. Trata-se de uma estrutura em forma circular, com uma plataforma de observação erguida no meio. Isso possibilitava que um observador central espionasse as celas situadas abaixo, ao redor do prédio. Cada prisioneiro nessas celas estava, então, ciente de que suas atividades eram vigiadas o tempo todo. As celas possuem uma janela para o exterior, por onde entra a luz, e uma para o interior, de frente para a torre central, de forma que o vigilante da torre central pode ver os prisioneiros, mas não o contrário. O efeito do Panóptico é criar a aparente onipresença do inspetor na mente dos ocupantes, “induzir no detento um estado consciente e permanente de visibilidade, que assegura o funcionamento automático do poder. Fazer com que a vigilância seja permanente em seus efeitos, mesmo se é descontínua em sua ação. O sucesso do poder disciplinar se deve sem dúvida ao uso de instrumentos simples: o olhar hierárquico, a sanção normalizadora e sua combinação com o exame”.
O poder, portanto, é visível, pois o detento sempre verá a torre central, e inverificável, pois o detento nunca saberá se está de fato sendo vigiado. Sua essência, assim, repousa na centralidade da situação do inspetor, combinada com as mais eficazes ferramentas para ver sem ser visto. É por meio dessa técnica que a sociedade regula seus membros. Segundo Foucault, o Panóptico não apenas aumenta o poder das autoridades, como também induz os indivíduos a internalizar aqueles que os vigiam, garantindo o funcionamento automático do poder. “Nossa sociedade não é de espetáculos, mas de vigilância. Não estamos nem nas arquibancadas nem no palco, mas na máquina panóptica, investidos por seus efeitos de poder que nós mesmos renovamos, pois somos suas engrenagens”.
VIDEOAULA: O PANÓPTICO DE FOUCAULT
A ideia de vigilância destacada na obra de Foucault nos parece mais atual do que nunca. Em 2013, Edward Snowden, um funcionário terceirizado da Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos (NSA), revelou um amplo esquema de espionagem na internet conduzido pelo serviço de inteligência norte-americano. De acordo com Snowden, o governo dos Estados Unidos (EUA), em parceria com servidores das nove principais empresas da internet (Microsoft, Yahoo, Google, Facebook, PalTalk, AOL, Skype, YouTube e Apple), registrou, sem mandado judicial, milhares de e-mails e telefonemas de norte-americanos, a pretexto de identificar supostos suspeitos de terrorismo. A denúncia de Snowden sustenta que a espionagem não se limitava a questões de segurança nacional, mas obedecia a princípios econômicos e políticos. O volume de registros armazenados pela NSA impressiona: foram 850 bilhões de chamadas telefônicas e cerca de 150 bilhões de registros de internet. Retomando Foucault, estaríamos vivendo em uma máquina panóptica?