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A história do Sri Lanka e a origem dos atentados terroristas da Páscoa

Os conflitos entre etnias e religiões já devastaram o país no passado. Agora, um grupo jihadista volta a ameaçar a frágil estabilidade política do país

Por Tiago Cordeiro
Atualizado em 24 abr 2019, 09h14 - Publicado em 23 abr 2019, 13h47

No último domingo (21), uma série de explosões igrejas e hotéis chocou Sri Lanka, país insular no Oceano Índico. Na data mais importante do cristianismo, pelo menos 320 pessoas morreram e 500 ficaram feridas. Os atentados do feriado de Páscoa no Sri Lanka aconteceram no momento em que o país está perto de celebrar, em maio, o aniversário de uma década do fim da guerra civil que devastou o território ao longo de 26 anos. Entre 1983 e 2009, a imagem do Sri Lanka estava diretamente ligada à devastação: de um lado, o governo realizava bombardeios aéreos contra áreas habitadas por civis; de outro, os membros do grupo Tigres de Libertação da Pátria Tâmil recrutavam crianças como soldados e desenvolviam os cinturões-bomba utilizados por grupos terroristas de todo o mundo desde então. As pessoas tinham medo de andar de ônibus: era comum que sacolas pretas largadas nos bancos explodissem.

Mas o país, com área equivalente à do Amapá e população semelhante à de Minas Gerais, também é conhecido pelos templos budistas bem preservados de Anuradhapura, a antiga capital. No Parque Nacional Yala, é possível andar ao lado de elefantes asiáticos. Entre as praias, destaca-se o balneário de Negombo, pela qualidade das ondas para a prática de surfe e pela boa infraestrutura para turismo. A capital administrativa do país, Colombo, é uma cidade moderna de 700 mil habitantes que parecia, até os últimos atentados, ter esquecido a guerra.

Antigamente conhecido como Ceilão, o Sri Lanka tem uma história milenar, marcada pelo cruzamento de pessoas de diferentes pontos do globo. Afinal, a nação está instalada numa ilha ao sul da Índia, num ponto estratégico transformado por moradia para cristãos, budistas, hinduístas, muçulmanos – e também a etnia tâmil, cujos desejos separatistas dispararam a guerra civil.

Conflitos étnicos

Os primeiros seres humanos chegaram ao local há pelo menos 135 mil anos. A região é conhecida como o primeiro território da Ásia a ser governado por uma mulher – foi no século 1 a.C., com a rainha Anula. Os primeiros hospitais de que se tem notícia em toda a história surgiram ali, em 431 a.C., numa época em que diferentes dinastias locais se sucediam no trono.

A partir do século 16, o Ceilão foi dominado, total ou parcialmente, por portugueses, holandeses e ingleses, nesta ordem, até alcançar a independência em 1948. A guerra civil aconteceu por consequência direta pela influência britânica, que, desde o século 19, valorizou uma das etnias locais, os tâmeis, que são de maioria hindu e vivem na faixa mais ao norte, em detrimento dos cingaleses, budistas em geral e moradores da área mais ao sul do país.

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Com o fim do domínio colonial, os cingaleses, que formam a maioria da população, chegaram ao poder e levaram o governo a adotar sua religião e sua língua como as oficiais do país. Em reação, o tâmil Velupillai Prabhakaran fundou, em 1976, os Tigres de Libertação da Pátria Tâmil. Quando o grupo realizou uma emboscada contra um comboio do exército e matou 13 militares, os tumultos populares que se seguiram provocaram a morte de pelo menos 3 mil tâmeis. Era o início da guerra civil, que contou com um cessar-fogo em 2002, encerrado três anos depois pela morte do tâmil Lakshman Kadirgamar, ministro do governo cingalês que promovia o diálogo entre os dois lados. O conflito foi marcado por episódios sangrentos, como o massacre de 33 monges budistas em Aranthalawa, em 1987.

Os tigres tâmeis contavam com sua própria marinha, uma força aérea formada por aviões de pequeno porte e um grupo de elite dedicado a matar políticos – alcançaram o objetivo em 1991, quando assassinaram o ex-premiê indiano Rajiv Gandhi, e dois anos depois, ao matar o presidente do Sri Lanka, Ranasinghe Premadasa. Em 2001, metade dos aviões comerciais do país foi destruída por um ataque tâmil ao aeroporto de Colombo.

Velupillai Prabhakaran morreu em 2009 em um ataque do governo, que depois anunciou o fim do conflito. Os próprios Tigres Tâmeis formalizaram, por e-mail, a capitulação. Estima-se que a guerra tenha provocado pelo menos 100 mil mortes.

Recuperação econômica

Desde então, a ONU questiona a falta de transparência do governo em lidar com o passado – há relatos de que moradores locais, acusados de colaborar com os terroristas, eram raptados por policiais e nunca mais vistos. Só nos meses que se seguiram ao fim da guerra, mais de 40 mil tâmeis teriam sido assassinados. O país ainda apresenta dificuldades em consolidar um governo democrático e capaz de lidar com os direitos humanos. Por exemplo: a lei local considera que a homossexualidade é uma prática criminosa.

Mas a economia vai muito bem: desde 2005, a renda per capita dobrou e o percentual de cidadãos pobres caiu de 15,2% para 7,6%. As taxas de alfabetização são altas para os padrões dos países em desenvolvimento: 92,5% na média da população e 98% entre os jovens. A expectativa de vida ao nascer é de 77,9 anos, mais alta, por exemplo, do que os 75,51 do Brasil. Os locais jogam vôlei e futebol, mas o esporte mais popular, disparado, é o críquete. O turismo atraiu, em 2018, 2,3 milhões de estrangeiros, vindos principalmente de Índia, China, Reino Unido, Alemanha e Austrália. Em 2009, eram apenas 448 mil.

O Sri Lanka é um país religiosamente diverso. A maioria da população (69%) é budista, mas há minorias relevantes: hindus são 13%, muçulmanos, 10%, e cristãos, 8%. De acordo com o governo do Sri Lanka, os ataques do domingo de Páscoa foram realizados por um grupo jihadista chamado National Thowheeth Jama’ath (NTJ). Antes de matar cristãos, ela era conhecida na região apenas por vandalizar estátuas budistas. Agora, a organização parece ter estreitado seus laços com o Estado Islâmico, na medida em que vem crescendo, no país, a influência de pensadores muçulmanos extremistas. O ataque teria sido uma retaliação ao atentado de março na Nova Zelândia, em que um terrorista cristão executou cerca de 50 muçulmanos em duas mesquitas.

O país convive também com um grupo radical budista, chamado Bodu Bala Sena, nome que significa Força Budista e foi fundado em 2012 pelos monges Kirama Wimalajothi e Galagoda Aththe Gnanasaara. Sinal de que o passado de confrontos voltou a cercar a vida no Sri Lanka, que agora enfrenta o desafio de evitar que atentados de motivação nacionalista ou religiosa voltem a atrasar o rumo de desenvolvimento do país, conhecido pelas contribuições para o budismo ao longo da história, além da qualidade do chá e do café que planta e exporta.

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Os conflitos entre etnias e religiões já devastaram o país no passado. Agora, um grupo jihadista volta a ameaçar a frágil estabilidade política do país

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