“Carta de Achamento do Brasil”: resumo da obra de Pero Vaz de Caminha
Considerada a certidão de nascimento do Brasil, a obra cobrada na lista da Unicamp carrega uma visão eurocêntrica e ajuda a compreender a colonização
A Carta de Achamento do Brasil, famoso texto de Pero Vaz de Caminha que narra a chegada dos portugueses ao país, faz parte da lista de leituras obrigatórias da Unicamp 2024. Carregado de valor histórico e cultural, o documento instiga o leitor a um olhar interdisciplinar, que associe Literatura, História e até Geografia.
Para ajudar o estudante a analisar as pouco mais de dez páginas da obra, O GUIA DO ESTUDANTE convidou o professor Vinicius Beltrão, coordenador de Ensino e Inovações do SAS Plataforma de Educação, e preparou um resumo com tudo o que você precisa saber sobre o livro. Confira!
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Contexto histórico e movimento literário
Conhecer o período histórico em que se passa e foi escrita determinada obra é o ponto de partida para compreendê-la, e no caso da Carta de Achamento este se torna um fator ainda mais relevante. Isso porque o texto, que narra a chegada dos europeus ao território que viria a se tornar o Brasil, também é a gênese de nossa literatura nacional.
Em termos formais, este período literário foi nomeado Quinhentismo, mas ele não é exatamente uma escola como o Romantismo ou o Realismo. Desenvolvido no Brasil ao longo do século 16, trata-se de um movimento inserido dentro da escola literária do Classicismo. Importante ressaltar que o Quinhentismo não está inserido na história da Literatura mundial, mas somente do Brasil.
“O Quinhentismo relata a chegada dos europeus às Américas e possui um olhar muito subjetivo, por conta da visão eurocentrista das pessoas que faziam parte das expedições. É a idealização dos europeus sobre esses povos e terras nativas durante a busca do metal e do ouro”, explica o professor da SAS.
O objetivo dos textos quinhentistas era registrar a vida, costumes, crenças e natureza da terra descoberta. Além da carta de Pero Vaz de Caminha, considerada a certidão de nascimento do Brasil, temos documentos da catequese dos indígenas, como documentos escritos pelo Padre Anchieta e por Gabriel Soares de Souza.
São documentos carregados de uma visão eurocêntrica e, portanto, preconceituosa em relação aos povos indígenas, e que refletem a mentalidade do europeu da época – marcada pela intolerância religiosa e racismo, entre outros aspectos.
O autor: quem foi Pero Vaz de Caminha
Pero Vaz de Caminha nasceu no ano de 1950 na cidade de Porto, Portugal. Foi o escrivão da expedição de Pedro Álvares Cabral, que seria, inicialmente, pelas Índias, resultando no descobrimento das Américas, em 1500. Faleceu no mesmo ano, em 15 de dezembro, na cidade de Calecute, na Índia.
Resumo da Carta de Achamento do Brasil
A Carta de Achamento do Brasil foi escrita no dia 1º de maio de 1500, e relata a chegada dos portugueses ao território hoje conhecido como Brasil, em uma expedição liderada por Pedro Álvares Cabral. O documento foi endereçado ao rei Dom Manuel I e trouxe uma descrição da natureza exuberante para os europeus – não apenas da terra, mas principalmente dos costumes dos povos indígenas e as primeiras impressões sobre eles.
A obra foi escrita em primeira pessoa, na qual o autor, o escrivão Pero Vaz de Caminha, é o próprio narrador, escrevendo, portanto, a partir de sua própria perspectiva. Caminha utiliza durante quase todo o texto a primeira pessoa do plural com o intuito de envolver os portugueses e avisá-los sobre as oportunidades na nova terra. Assim, ele engloba os portugueses que estavam na expedição e os portugueses que estavam em Portugal.
Neste dia, a horas de véspera, houvemos vista de terra!
Primeiramente dum grande monte, mui alto e redondo; e doutras serras mais baixas ao sul dele; e de terra chã, com grandes arvoredos: ao monte alto o capitão pôs nome – o Monte Pascoal e à terra – a Terra da Vera Cruz.
Mandou lançar o prumo. Acharam vinte e cinco braças; e ao sol posto, obra de seis léguas da terra, surgimos âncoras, em dezenove braças — ancoragem limpa. Ali permanecemos toda aquela noite. E à quinta-feira, pela manhã, fizemos vela e seguimos em direitos à terra, indo os navios pequenos diante, por dezessete, dezesseis, quinze, catorze, treze, doze, dez e nove braças, até meia légua da terra, onde todos lançamos âncoras em frente à boca de um rio. E chegaríamos a esta ancoragem às dez horas pouco mais ou menos.
Dali avistamos homens que andavam pela praia, obra de sete ou oito, segundo disseram os navios pequenos, por chegarem primeiro.
Então lançamos fora os batéis e esquifes, e vieram logo todos os capitães das naus a esta nau do Capitão-mor, onde falaram entre si. E o Capitão-mor mandou em terra no batel a Nicolau Coelho para ver aquele rio. E tanto que ele começou de ir para lá, acudiram pela praia homens, quando aos dois, quando aos três, de maneira que, ao chegar o batel à boca do rio, já ali havia dezoito ou vinte homens.
Eram pardos, todos nus, sem coisa alguma que lhes cobrisse suas vergonhas. Nas mãos traziam arcos com suas setas. Vinham todos rijos sobre o batel; e Nicolau Coelho lhes fez sinal que pousassem os arcos. E eles os pousaram.
Principais características da obra
É importante que o leitor esteja atento a alguns pontos que são amplamente discutidos sobre a Carta de Achamento – tanto pela crítica histórica, quanto pela crítica literária. Um desses pontos é a visão eurocêntrica do texto, que reflete muitos preconceitos comuns à época e ainda hoje.
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A carta valoriza a cultura europeia, colocando-a em um nível mais elevado, enquanto inferioriza as culturas locais. Esse preconceito que atribui um valor maior a determinada cultura se chama aculturação: o processo de sobrepor sua cultura a cultura do outro. A aculturação ocorreu de maneira pungente durante a colonização das Américas.
A preocupação dos portugueses em estabelecer a cultura do povo português para os indígenas é o mote da carta, demonstrando que não há nenhum cuidado em, de fato, compreender o modo de vida que encontraram na nova terra. O grande foco dos portugueses era catequizar e evangelizar os povos nativos, que são descritos de forma estereotipada.
A construção desta imagem dos indígenas como selvagens e não civilizados serviu para justificar o processo de colonização e, consequentemente, a escravização dos povos nativos.
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Além disso, a perspectiva indígena não aparece na carta: o primeiro contato entre portugueses e povos originários é narrado do ponto de vista dos europeus e não reflete, portanto, o fato em sua totalidade. Da perspectiva histórica, também vale mencionar que a obra apresenta algumas falhas e imprecisões, como a data exata de chegada dos portugueses e uma descrição floreada e pouco realista sobre a fauna, flora e indígenas encontrados pelos portugueses.
Por fim, este é um documento que carrega interesses políticos e comerciais. A carta cumpre o objetivo de comunicar ao rei de Portugal o que aconteceu durante a expedição e, principalmente, incentivar a colonização da nova terra.
A Carta de Achamento e a Unicamp
Para Vinicius Beltrão, a importância da inserção desta leitura na Unicamp se encontra justamente em sua natureza controversa. “A relevância disso para o vestibular é o fomento do senso crítico dos alunos. O estudante precisa ter um senso crítico muito apurado e precisa de repertório para associar esse documento não só ao conhecimento da Língua Portuguesa, mas ao conhecimento histórico e geográfico do Brasil.”
Um texto como este, que tem valor para a Literatura e para a História, condiciona o aluno a demonstrar repertório em outras áreas de conhecimento e se posicionar em relação a isso.
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