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O que explica as enchentes e secas recordes no Brasil

Rios brasileiros passaram por suas maiores cheias e piores secas na última década. Explicamos o que as mudanças climáticas têm a ver com tudo isso

Por Luccas Diaz
Atualizado em 20 jun 2024, 17h14 - Publicado em 5 jun 2024, 08h00
seca no Rio Amazonas e enchente RS
 (Gustavo Basso/NurPhoto/Gilvan Rocha/Getty Images/Agência Brasil)
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Há semanas, cientistas estão vindo à público alertar: não faltam indícios de que as fortes chuvas que causaram enchentes no Rio Grande do Sul têm relação direta com as mudanças climáticas. Agora, um novo levantamento do Serviço Geológico do Brasil (SGB), realizado a pedido do jornal Folha de S. Paulo, mostra também que a catástrofe não é isolada. Ao longo da última década, o número de vezes que enchentes e secas bateram recordes em todo o país foi muito maior do que comparado a períodos anteriores. Os mesmos rios que enfrentam períodos de seca nunca antes vistos, em outros anos transbordam, alagando cidades inteiras.

Veja abaixo os principais números do levantamento e entenda a relação entre mudanças climáticas, o regime de chuvas e as secas e enchentes recordes.

O excesso e a falta de água

Entre 2014 e 2023, foram registrados 314 recordes de cheias, enquanto na década anterior, esse número foi de 182. No mesmo período, as secas bateram 406 recordes, um aumento expressivo em relação aos 92 da década anterior. Arthur Matos, coordenador do Sistema de Alerta Hidrológico do SGB, destacou em entrevista à Folha que o número de estações de monitoramento permaneceu estável nas duas décadas, garantindo a confiabilidade dos dados comparativos.

O aumento preocupa. Como se os recordes já não fossem impressionantes isoladamente, o levantamento mostra uma tendência crescente de recordes consecutivos, indicando que, a cada novo evento extremo, a probabilidade de superar recordes anteriores aumenta. Sabe aquela máxima de que cada ano daqui em diante será o mais quente da sua vida? É como se o mesmo valesse para as secas e enchentes: elas se tornarão cada vez piores.

Na região Sul, os rios Taquari e Caí, no Rio Grande do Sul, bateram os três maiores recordes de cheias nos últimos dois anos. Em Uruguaiana (RS), o rio Uruguai registrou dois de seus maiores índices em 2017 e 2022. Essa tendência se repete em outras regiões do Brasil: o rio Amazonas teve sua maior cheia em 2021 e sua pior seca em 2023; o rio Branco, no Acre, registrou suas duas maiores cheias em 2023 e 2024; e o rio Madeira, em Porto Velho, enfrentou sua pior seca em 2023.

Rio Amazonas na região da Comunidade Porto Praia, em 8 de outubro de 2023.
Rio Amazonas na região da Comunidade Porto Praia, em 8 de outubro de 2023. (Gustavo Basso/NurPhoto/Getty Images)
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Percebe o padrão? Todos esses eventos, sejam eles enchentes causadas por chuvas intensas ou secas severas, ocorreram na última década. “Tanto de excesso quanto de falta de água”, observa o coordenador.

Para Marcus Suassuna, pesquisador do SGB, há sinais de alterações nos ciclos das chuvas. Ele destaca que as precipitações estão se concentrando em períodos mais curtos, ao invés de se distribuírem ao longo de uma estação, como é o esperado. O fenômeno preocupa ainda mais em áreas urbanizadas ou com pouca vegetação, onde a água da chuva chega rapidamente aos rios, que não conseguem absorver o volume de água na mesma velocidade.

Como as mudanças climáticas afetam o regime de chuvas

infográfico mostra o ciclo da água

As mudanças climáticas têm um impacto direto no ciclo da chuva, alterando a forma como a água se movimenta e se distribui na atmosfera e no solo. Toda a água disponível no planeta está em constante renovação através do chamado ciclo hidrológico. Neste processo, a energia solar desempenha um papel crucial, provocando a evapotranspiração das águas, isto é, fazendo com que elas passem do estado líquido para o gasoso.

Com a evaporação, o vapor de água se acumula e forma as nuvens, que se deslocam com o movimento de rotação da Terra e dos ventos. Quando essas nuvens se condensam, ocorre, então, a precipitação, trazendo a água de volta à superfície terrestre – seja na forma líquida (chuva), ou sólida (neve ou granizo), a depender das condições climáticas da região.

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Ao atingir os continentes, o destino dessas águas é influenciado por fatores como a cobertura vegetal, as condições climáticas, a geologia e a altitude. Em áreas mais áridas, por exemplo, a evaporação é maior que a infiltração, enquanto em terrenos arenosos, a água se infiltra mais rapidamente.

+ Entenda como a Amazônia afeta o clima do mundo todo

O que acontece é que as mudanças climáticas intensificam e desregulam esses processos naturais, resultando em padrões de precipitação irregulares e, por vezes, extremos. A elevação das temperaturas globais aumenta a evaporação da água dos oceanos, rios, lagos e solo, e com mais vapor de água na atmosfera, há o aumento na quantidade de precipitação em algumas regiões.

No entanto, observa-se que essa precipitação tende a se tornar mais intensa e concentrada durante curtos períodos, ao invés de se distribuir ao longo de uma estação, resultando em chuvas intensas que podem causar enchentes e alagamentos.

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Para completar, os gases do efeito estufa também atrapalham o fluxo das frentes de ar. Em entrevista à Folha, a especialista do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), Chou Sin Chan, explicou que, no caso do Rio Grande do Sul, uma massa destes gases impediu que a frente fria se deslocasse do Sul em direção ao Sudeste, o que provocou um período mais longo de chuvas por lá. O restante da história, você já sabe.

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