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O desmanche soviético

No Natal de 1991, a crise do bloco socialista provocava o desmembramento da União Soviética, colocando um ponto final na Guerra Fria

Por Guilherme Eler
Atualizado em 15 Maio 2019, 22h34 - Publicado em 20 dez 2016, 18h44

O desmanche soviético

No dia 25 de dezembro de 1991, a icônica bandeira vermelha com a foice e o martelo da União Soviética (URSS) tremulou pela última vez no alto do Kremlin, a sede do governo. Ela deu lugar à bandeira tricolor da Rússia, o novo país que acabava de nascer com o desmembramento de 15 repúblicas que formavam a URSS. O ato simbólico foi precedido pela renúncia do presidente Mikhail Gorbatchov, oficializada em um pronunciamento de 12 minutos em rede nacional. “Somos herdeiros de uma grande civilização e agora depende de cada um de nós que ela renasça para uma nova vida moderna e digna”, bradou o ex-líder soviético. O tom ufanista do discurso contrastava com as incertezas diante das transformações econômicas e políticas em curso. O desafio, afinal, não era dos mais simples: a maior nação comunista deixava de existir, e a Rússia entrava em um árduo processo de transição ao sistema capitalista.

Guerra Fria

A URSS surgiu em 1922 após um longo processo revolucionário, iniciado em 1917, que sepultou a monarquia russa (o czarismo) e deu origem à primeira nação comunista do mundo. Na II Guerra Mundial (1939-1945), ao lado de Estados Unidos (EUA), França e Reino Unido, os soviéticos exerceram papel crucial para derrotar as forças do eixo nazifascista, liderado por Alemanha, Itália e Japão.

Ao final do conflito, a URSS e os EUA emergiram como as duas maiores potências mundiais nos campos econômico, político e militar. A Guerra Fria caracterizou-se por uma disputa predominantemente no campo ideológico, com o planeta dividido em dois blocos: o mundo capitalista, liderado pelos EUA, e o socialista, encabeçado pela URSS. As duas potências procuravam cooptar as demais nações do planeta a integrar suas esferas de influência político-econômicas (capitalista ou socialista). A URSS projetou-se principalmente sobre o Leste Europeu, estimulando a instalação do socialismo nos países que havia libertado do jugo nazista, como Tchecoslováquia e Hungria.

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Apesar de EUA e URSS não entrarem em um confronto militar direto, os conflitos indiretos foram frequentes. A Guerra da Coreia (1950-1953), por exemplo, foi iniciada por causa da invasão da Coreia do Sul, capitalista, pela Coreia do Norte, socialista. Episódios como a Revolução Cubana (1959) e a Guerra do Vietnã (1959-1975) também revelaram momentos de tensão, colocando as duas potências em lados opostos.

Outra consequência do mundo bipolar foi a intensificação da corrida armamentista – com elevados investimentos na ampliação do arsenal nuclear – e a corrida espacial – acirrada competição tecnológica que culminou com a chegada do norte-americano Neil Armstrong à Lua, em 1969.

Glasnost e perestroika

Os esforços promovidos com as corridas armamentista e aeroespacial começam a cobrar o seu preço a partir da década de 1970. A URSS atravessou uma grave crise de alimentos, devido à realocação dos investimentos financeiros para as atividades militares. Como as demandas internas não eram atendidas e a produtividade era baixa, a insatisfação popular com o regime crescia a cada dia. O esforço de guerra decorrente da invasão do Afeganistão pelos soviéticos, entre 1979 e 1989, enfraqueceu ainda mais a economia.

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Em meio ao agravamento da crise, Mikhail Gorbatchov assumiu o poder em 1985, com uma proposta de governo baseada em duas reformas: glasnost e perestroika. Por meio da glasnost (transparência), o governo tentava dissociar-se da noção de Estado onipresente e permitindo maior liberdade de expressão, ainda que com restrições. Tornar os mecanismos de decisão política mais transparentes à população era essencial para a estabilização do governo, composto por instituições extremamente burocráticas e maculado por décadas de corrupção. Gorbatchov também melhorou as relações com os EUA e assinou acordos para frear a corrida armamentista.

A perestroika (reestruturação) representava a tentativa de recuperação econômica, com a transição para uma economia de mercado. Para que fosse retomado o crescimento, houve estímulo à abertura do mercado nacional, com a instalação de empresas estrangeiras e a formulação de planos de produção independentes para as indústrias, fortalecendo a iniciativa privada. A diminuição dos investimentos no setor de defesa também possibilitou concentrar as receitas na recuperação econômica e social. As medidas, no entanto, não foram suficientes para reabilitar a URSS.

Efeito dominó

Paralelamente, no final dos anos 1980, movimentos pró-democracia ganhavam força no Leste Europeu. O Muro de Berlim, que dividia a cidade alemã entre as esferas de influência socialista e capitalista, veio abaixo em novembro de 1989, marcando o início do processo de reunificação da Alemanha e a extinção do modelo socialista. Os movimentos populares no Leste Europeu, em sua maioria, não encontraram grandes impedimentos e conseguiram derrubar os governos. Há o retorno do pluripartidarismo e da democracia, que sinalizam o início da transição ao regime capitalista.

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Com o desdobramento dos movimentos de desintegração no bloco socialista, o governo perdeu o controle da situação. Insatisfeitos com os rumos do país, aliados próximos a Gorbatchov e líderes militares comunistas arquitetaram um golpe em agosto de 1991. De férias na região da Crimeia, o governante foi capturado e mantido prisioneiro por três dias. Os responsáveis foram presos e o líder soviético voltou ao poder. Mas o retorno foi apenas provisório. Diante da pressão, o Parlamento acabou votando pela dissolução da URSS em setembro. Gorbatchov renunciou no Natal daquele ano, e a potência soviética deixava de existir.

A desintegração do bloco soviético deu origem a 15 países e à criação da Comunidade dos Estados independentes (CEI) – um fórum de coordenação política e econômica sob liderança da Rússia. Com o fim da Guerra Fria, tem início a chamada Nova Ordem Mundial. Ela se caracteriza pela intensificação do processo de integração econômica e pela abertura dos mercados a partir do fenômeno da globalização. Sem um rival à altura, os EUA consolidaram sua supremacia e firmaram-se como a única potência global.

*Publicado originalmente no GUIA DO ESTUDANTE Atualidades Vestibular + Enem – 2º semestre 2016

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