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“Vestido de Noiva” – análise da obra de Nelson Rodrigues

Entenda os principais aspectos da obra

Por Redação do Guia do Estudante
Atualizado em 12 abr 2018, 15h29 - Publicado em 28 set 2012, 21h42

Encenada pela primeira vez em 1943, a peça de Nelson Rodrigues mostra ações simultâneas em três planos – da realidade, da alucinação e da memória e deu início ao processo de modernização do teatro brasileiro.

– Leia o resumo de Vestido de Noiva

Aplausos dos insultados
A peça “Vestido de Noiva”, de Nelson Rodrigues, é um marco na história da dramaturgia nacional. A primeira montagem, em dezembro de 1943, deu início ao processo de modernização do teatro brasileiro.
Essa era a segunda peça escrita por Nelson. O autor trabalhava como jornalista, profissão que herdara do pai, e procurava, naquele período, uma fonte de sustento complementar. Seu primeiro trabalho para os palcos, “A Mulher sem Pecado”, tinha como pretensão conseguir o sucesso obtido por outras produções da época, como A Família Lero-Lero, comédia de Raymundo Magalhães Júnior. Embora a peça de Nelson fosse uma obra de valor artístico muito superior à de Magalhães Júnior, ao estrear, em 1942, não obteve a simpatia do público e resultou em fracasso de bilheteria.

Um ano depois, Vestido de Noiva, de estrutura mais complexa, iria revolucionar o teatro brasileiro. A montagem foi realizada sob a direção do polonês Zbigniew Marian Ziembinski, que chegara ao Brasil cerca de dois anos antes. Experiente encenador, Ziembinski deu forma ao texto de Nelson. Seu rigor na encenação, com a exigência de ensaios constantes, levou a concepção brasileira de teatro a novos níveis.

A grande tensão que permeia a peça não se mostra apenas no antagonismo entre Alaíde e Lúcia, mas nas relações conflitantes entre todos os personagens. Nas cenas, a angústia da culpa supera sempre os tons de ternura amorosa com que geralmente são apresentados os laços familiares. As relações de desejo são também relações de ódio.

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Um exemplo é a relação entre Lúcia e Pedro, cujo impulso poderia parecer exclusivamente erótico, um desejo cuja realização era impossibilitada pelo casamento entre Pedro e Alaíde. Tendo morrido Alaíde, era de esperar que um se entregasse ao outro imediatamente, mas o mecanismo da culpa atua, o que leva Lúcia a prometer diante do cadáver da irmã jamais ficar com Pedro. Desse conflito se depreende toda uma rede de ambivalências, que nascem também sob o signo do ridículo.

O gênero que, por excelência, incorpora o ridículo da desmesura sentimental é o melodrama moderno. Isso ocorre porque o melodrama parece tentar imitar a catarse da tragédia clássica numa época em que a indignação já não tem lugar. Valores como a honra perderam o significado, numa sociedade em que a dignidade depende de pressupostos materiais.

A peça configura uma crítica cáustica a determinada classe da sociedade carioca. Tal como ressalta o crítico Ronaldo Lima Lins: “Vestido de Noiva movimenta seu drama dentro de um círculo fechado. Ali está uma peça cujos problemas se passam no nível da pequena burguesia, que a aplaudiu e lhe deu notoriedade”. Nessa maneira velada de ação, está o êxito do teatro de Nelson Rodrigues: agradar a sua plateia, ao mesmo tempo em que a insulta.

Estrutura
A representação é dividida em três planos: da alucinação, da memória e da realidade. Há também duas escadas laterais. A peça se desenrola em três atos, cuja relação não é exatamente cronológica, a não ser no plano da realidade, o qual acompanha a degradação do estado de saúde de Alaíde e a aniquilação consequente dos outros dois planos.

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Comentário do professor
Escrita e levada à cena em 1943, “Vestido de noiva” é uma espécie de “divisor de águas” do teatro brasileiro. Trata-se de uma peça revolucionária do ponto de vista estético-estrutural, cuja lógica interna remete a recepção (público) a um estado de perplexidade até então não protagonizado na dramaturgia brasileira. O argumento gira em torno da vida de Alaíde, personagem representativa da burguesia carioca, que morre tragicamente em um acidente (atropelada). Alaíde é levada ao hospital e, enquanto os médicos tentam salvá-la, ela protagoniza um tipo muito peculiar de viagem interior, uma jornada psíquica, de uma profundidade imaterial e antropológica que resgata seu passado e as figuras humanas que exerceram papéis decisivos em sua constituição. Alaíde, mulher voluntariosa e arrogante, conquistou Pedro, o namorado da irmã, Lúcia. Admiradora de Madame Clessi, antiga prostituta do Rio de Janeiro, Alaíde via em sua figura uma espécie de modelo de liberdade e de transgressão dos valores sociais. Enquanto está casada com Pedro, este protagoniza um caso adúltero com Lúcia, personagem com quem primeiro ia se casar. Após a morte de Alaíde, Pedro e Lúcia se casam, sem o menor remorso.

“Vestido de noiva” é uma peça absolutamente inusitada, porque o argumento acima proposto é apresentado sob uma perspectiva não linear e aparentemente caótica. A estrutura da obra, como referimos acima, propõe três planos: 1) Plano da realidade – Alaíde é atropelada e levada ao hospital. Enquanto os médicos tentam recuperá-la, a imprensa divulga a notícia do trágico acidente. Não resistindo aos ferimentos, Alaíde morre. 2) Plano da alucinação – Alaíde está em busca de uma mulher misteriosa, Madame Clessi, prostituta que fora assassinada pelo namorado de dezessete anos. Os diálogos entre ambas são esclarecedores e convergentes para a resolução dos dramas da personagem central. 3) Plano da memória – as lembranças do passado de Alaíde vêm à tona e se consubstanciam com as imagens do plano da alucinação. É possível imaginar a extraordinária produção cênica que essa concepção teatral exigiu, principalmente de atores e equipe técnica, quando foi pela primeira vez apresentada, em 1943. A crítica social é inquestionável, pois Nelson Rodrigues não perdoou a hipocrisia social. Por isso mesmo, fez do teatro uma ferramenta de denúncia, capaz de pôr por terra as máscaras (assim como fizera, no século XIX, Machado de Assis), revelando a face sombria e desumana da sociedade carioca do século XX.

Marcílio Bittencourt Gomes Jr., Professor da Oficina do Estudante – Campinas (SP)

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