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Redação nota 1000 no Enem citou desenho da Disney

Além de "Corcunda de Notre Dame", Fernanda Barbosa também mencionou um seriado da Netflix para debater a valorização de povos tradicionais no Brasil

Por Redação do Guia do Estudante
Atualizado em 14 set 2023, 13h51 - Publicado em 13 set 2023, 15h49
Cena da animação O Corcunda de Notre Dame
 (Disney/Reprodução)
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Fernanda Barbosa, de 21 anos, foi uma das pouquíssimas participantes do Enem 2022 agraciadas com uma nota mil na redação. A carioca de São João de Meriti, agora aprovada no curso de medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), garantiu a nota máxima sem a necessidade de citar grandes filósofos do mundo Ocidental ou pensadores contemporâneos. Em vez disso, a estudante usou repertórios mais rotineiros, de seu dia a dia, como a animação da Disney “O Corcunda de Notre Dame” e o seriado brasileiro disponível na Netflix “Cidade Invisível”.

A sua professora de redação, Milla Borges, que tem um curso especializado em redação do Enemé grande defensora desse método. “É possível escrever bem, utilizando as suas músicas, séries, livros e filmes favoritos. Dessa forma, fica bem mais fácil conquistar os 200 pontos na competência 2, que é a competência que avalia se o repertório sociocultural é legitimado por alguma área do conhecimento, se é pertinente ao tema e se tem um uso produtivo no texto”, diz ela.

Fernanda nem sempre teve facilidade ou aptidão com a escrita. Para chegar à tão sonhada nota 1.000, ela produziu dezenas de redações, pelo menos uma por semana, ao longo dos anos em que tentou entrar em medicina. “Cada vez que eu recebia um texto corrigido, eu ia lá, via o que dava para melhorar e reescrevia. Às vezes dava aquela raiva, que eu via que errava sempre as mesmas coisas, que não era mais pra eu errar. Mas eu sempre refazia”, conta a futura médica.

Fernanda Barbosa, agora aprovada em Medicina na UFRJ, dá a dica: valorize a redação do Enem.
Fernanda Barbosa, agora aprovada em Medicina na UFRJ, dá a dica: valorize a redação do Enem. (Instagram/Arquivo pessoal)

Para quem vai fazer o Enem este ano, Fernanda dá a sua dica mais preciosa: “Mantenha a calma na hora da prova. Mesmo que alguma coisa dê errado, ainda dá para se acalmar na hora para enfrentar a situação. Funcionou muito para mim”, diz.

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A frase-tema da redação Enem 2022 foi Desafios para a valorização de comunidades e povos tradicionais no Brasil. Para quem for prestar a prova este ano, ler textos que tiraram notas altas é sempre uma boa estratégia de estudo.

+ Leia na íntegra redações nota 1000 do Enem 2022

Leia a seguir o texto que deu à Fernanda a nota máxima no Enem 2022. Quem analisou a redação foi a própria professora da Fernanda, Milla Borges.

A redação que rendeu a Fernanda Barbosa a nota máxima no Enem.
A redação que rendeu a Fernanda Barbosa a nota máxima no Enem. (Arquivo Pessoal/Reprodução)

Leia a redação de Fernanda

Introdução

Na série brasileira “Cidade Invisível”, parte da trama é composta por uma população ribeirinha – que utiliza os recursos da floresta e do rio para a subsistência – sendo ameaçada por uma empresa em busca de lucro com a exploração da região. Fora da ficção, esse cenário é verossímil com a realidade do país, já que há uma nociva marginalização dos povos tradicionais, como indígenas, ciganos e populações ribeirinhas. Nesse sentido, a expansão do capital e o preconceito são desafios importantes para a valorização desses indivíduos.

Comentário da professora:

Na introdução, a aluna seguiu uma estrutura infalível: contextualização, seguida da apresentação do tema, evidenciando o problema e, na sequência, a tese com os dois argumentos. A contextualização funciona como um “pano de fundo” para a  abordagem temática. Para tal, Fernanda utilizou muito bem um repertório do seu cotidiano: a série brasileira “Cidade invisível”. Em seguida, ela apresentou o tema, mencionando as principais palavras que compõem a frase temática – o que é uma excelente estratégia, pois ajuda o corretor a identificar a abordagem completa do tema. Por fim, a aluna expôs o seu ponto de vista, ou seja, a tese com os dois argumentos: a expansão do capital (argumento 1) e o preconceito (argumento 2). Esta etapa também é bastante importante, uma vez que auxilia na identificação, por parte do corretor, de um projeto de texto – o qual é avaliado na competência 3.

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A estrutura utilizada pela aluna é bastante segura, pois faz com que a introdução cumpra muito bem a sua função. Além disso, essa introdução nos mostra que é possível fazer uma boa contextualização sem a necessidade de ficar decorando teorias ou citações de filósofos com os quais, muitas vezes, o aluno não tem a menor afinidade. É possível escrever bem, utilizando as suas músicas, as suas séries, os seus livros e os seus filmes favoritos. Dessa forma, fica bem mais fácil conquistar os 200 pontos na competência 2, que é a competência que avalia se o repertório sociocultural é legitimado por alguma área do conhecimento, se é pertinente ao tema e se tem um uso produtivo no texto.

Desenvolvimento 1

Diante do exposto, nota-se que o crescimento econômico desenfreado gera conflitos para as comunidades originais. Isso porque, atualmente, a expansão do capital ocorre em detrimento da existência desses povos, já que, no Brasil, a acumulação financeira está intimamente relacionada ao uso da terra ocupada, em parte, por grupos tradicionais. Um exemplo disso é o fenômeno geográfico e econômico da invasão de espaços historicamente indígenas pelos produtores de soja – principal produto do agronegócio brasileiro – para plantarem mais e, assim, lucrarem mais com a exportação dessa mercadoria. Sob tal ótica, os cidadãos nativos perdem brutalmente seus territórios e seus direitos básicos de moradia, devido à lógica empresarial de lucrar a todo custo. Logo, o Estado precisa agir ativamente em relação a essa situação hostil a que os indígenas estão sendo submetidos.

Comentário da professora: 

Os parágrafos de desenvolvimento que a Fernanda construiu também estão muito bem estruturados. Eles estão organizados em uma sequência lógica, divididos em tópico frasal, ampliação (que no ENEM se subdivide em problematização e fundamentação) e finalização. 

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No primeiro parágrafo de desenvolvimento, a aluna iniciou o seu processo argumentativo reafirmando o seu argumento (a expansão do capital) no tópico frasal, juntamente com a causa do problema, isto é, o fato de que, no Brasil, a acumulação financeira está relacionada ao uso da terra, ocupada, em partes, pelos povos tradicionais. Na sequência, a aluna usou como exemplo um fenômeno geográfico e econômico relacionado ao agronegócio para comprovar essa expansão do capital. Ponto interessante: ela fez uso de um conhecimento de outra área (da Geografia) para fundamentar o argumento. Em seguida ela expôs como consequências do problema a perda de território e de direitos básicos de moradia dos povos nativos, deixando clara a relação desses dois aspectos com a lógica empresarial, o que serviu para reforçar o seu argumento. Por fim, Fernanda finalizou o parágrafo antecipando um possível agente para a resolução da problemática por ela discutida (agente este que, mais à frente, foi retomado na proposta de intervenção, mostrando uma excelente conexão entre o desenvolvimento e a conclusão). Dessa forma, o parágrafo está bem construído, com as ideias muito bem desenvolvidas e sem lacunas.

Desenvolvimento 2

Ademais, observa-se que o preconceito é um obstáculo para o enfrentamento da temática. Tal premissa deve-se à disseminação massiva – oriunda de uma herança eurocêntrica que desvaloriza culturas distintas – de estereótipos degradantes sobre grupos minoritários, como quilombolas e ciganos. Consequentemente, há a criação, no imaginário social, de uma visão negativa acerca desses povos, gerando uma marginalização, e uma exclusão deles em relação à sociedade. Para ilustrar, nota-se a animação “O Corcunda de Notre Dame”, na qual uma personagem cigana é fortemente desrespeitada e invisibilizada socialmente devido ao preconceito contra essa cultura. Fora das telinhas, apesar de ficcional, a obra retrata uma situação que é a terrível realidade de muitos povos tradicionais. Então, essa descriminação precisa ser urgentemente combatida pelas escolas.

Comentário da professora: 

No segundo parágrafo de desenvolvimento, a aluna construiu um tópico frasal, no qual evidenciou o seu segundo argumento: o preconceito. Em seguida,  Fernanda seguiu uma organização de ideias pautada em causa, consequência e fundamentação. Como causa do preconceito, ela apresentou a herança eurocêntrica que tende a desvalorizar culturas diferentes e criar estereótipos de grupos minoritários, tendo como consequência a marginalização e a exclusão dessa parcela da população. No período seguinte, ela elaborou a fundamentação do argumento, utilizando produtivamente como repertório sociocultural o filme da Disney “O Corcunda de Notre Dame” justamente para ilustrar o preconceito sofrido por uma personagem cigana. Para finalizar o parágrafo, a aluna aplicou a mesma estratégia que utilizou no primeiro parágrafo de desenvolvimento, isto é, ela sugeriu um agente capaz de enfrentar a questão do preconceito, o qual foi mencionado novamente na elaboração da proposta de intervenção. 

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Conclusão

Fica evidente, portanto, que mudanças são importantes para a atenuação da conjuntura brasileira. A princípio cabe ao Estado – responsável pelo bem-estar do povo – mediar os conflitos entre empresários agricultores e grupos tradicionais, por meio da proteção dos territórios ocupados por essas minorias, da fiscalização constante de tais locais e da aplicação de multas aos infratores, no afã de assegurar as moradas da população nativa e de conter o avanço desmedido do capital. Concomitantemente, é dever das escolas – principais responsáveis pela formação crítica cidadã – impedir a disseminação de preconceitos contra grupos tradicionais, por intermédio de palestras informativas e de rodas de conversa sobre o tema, com o fito de educar a nova geração para incluir e para acolher os pertencentes a esses povos. Assim, será possível, enfim, que a série “A Cidade Invisível” não seja mais tão verossímil com o contexto do Brasil.

Comentário da professora:

Na conclusão, a aluna cumpriu todos os requisitos para gabaritar a competência 5, a qual avalia a elaboração da proposta de intervenção. Ela iniciou a conclusão com um conectivo de valor conclusivo e evidenciou a necessidade de mudanças que atenuem o problema. Na sequência, Fernanda fez duas propostas – uma para cada argumento discutido – e em ambas ela apresentou os 5 elementos exigidos pela banca para chegar aos 200 pontos. São eles: agente, ação, meio ou modo de execução da ação, efeito ou finalidade e detalhamento. Na finalização do parágrafo conclusivo, ela fechou com chave de ouro a redação ao retomar o repertório utilizado na introdução.

Além disso, o texto não teve desvios gramaticais ou falhas na estruturação sintática, o que garantiu à aluna 200 pontos na competência 1. Fernanda também utilizou muito bem os operadores argumentativos e os demais mecanismos coesivos, gabaritando, assim, a competência 4. 

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