Vergonha e indignação foram os termos mais usados por alunos e ex-alunos ouvidos pelo GUIA DO ESTUDANTE após a polêmica envolvendo uma autoridade da Universidade Presbiteriana Mackenzie e o projeto de lei anti-homofobia. Na semana passada, uma carta aberta assinada pelo chanceler Augustus Nicodemus Gomes Lopes em que ele se opõe frontalmente à aprovação da lei gerou discórdia dentro e fora dos campi da universidade paulista. Gomes Lopes representa o Instituto Presbiteriano Mackenzie na universidade. Ele defende na carta que religiões, como a Igreja Presbiteriana (ligada ao Mackenzie), que não aceitam a homossexualidade não podem ser taxadas de homofóbicas porque isso feriria o direito à liberdade de expressão e de credo. O fato de a carta ter sido divulgada (e depois retirada sem explicação) no site do Mackenzie deu outra dimensão a um texto cujo conteúdo não é novidade. Em 2007 a Igreja Presbiteriana já tinha usado os mesmos argumentos para se opor à lei.“Minha reação foi de revolta”, lembra Thiago Mattar, estudante de Jornalismo. “É claro que todos temos liberdade de pensar o que quiser sobre orientação sexual com base na religião, mas nenhum posicionamento religioso tem poder num Estado laico”. Thiago está organizando um manifesto público contra a posição do chanceler, marcado para a próxima quarta-feira (24), na universidade. “Não sou homossexual, acho que muitos não se posicionam publicamente a esse respeito porque têm medo. Entende? Medo. Isso reforça a postura conivente com o assédio moral. Tenho colegas homossexuais, acho que todos têm, não? É normal”, diz. Maíra Xavier, também estudante de Jornalismo, acredita que a manifestação servirá “para que as pessoas saibam que nós alunos não concordamos com o que foi publicado na carta”. Chocada, Isabelle Alegro, colega de Maíra, acha errado misturar política e religião. “Ainda mais em uma universidade, onde há uma enorme diversidade de pessoas”, endossa. A advogada Deborah Facco, formada pela universidade no ano passado, disse ter sentido uma “profunda vergonha”. “Ela, que evita rótulos para se descrever e se diz simpatizante da causa LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transsexuais), cita o orgulho tão propagado pelos alunos que passaram pelos bancos da universidade. “Estudar lá é mais que querer aprender, é uma paixão. Desde cedo aprendemos que, uma vez mackenzista, sempre mackenzista. Então, é com muito pesar que digo que, pela primeira vez, sinto vergonha de ser mackenzista”, desabafa. HOMOFOBIA “Não é só no Mackenzie, em qualquer lugar tem homofobia”, diz Isabelle. Nenhuma das outras pessoas entrevistadas, no entanto, disse ter visto alguma manifestação homofóbica no Mackenzie. “Até a [publicação da] infeliz carta”, lembra Deborah. “O chanceler em nada representa o real corpo pensante dessa instituição”, diz Thiago. “Preconceito velado existe em todas as universidades. Mas depois dessa atitude arbitrária do chanceler a imagem que se passa da instituição é que continuamos a ser aquele reduto de caça-comunistas e patrulheiros ideológicos do período da ditadura militar”. Para o estudante, no campus “o clima é de tensão e revolta”. Na internet, Deborah diz que a situação começa a assustar. “Nos grupos de discussão do Mackenzie há comentários que estão passando dos limites. Estão calorosos, de um lado os que defendem a carta acusam os homossexuais de preconceito contra a religião e de outro os que acusam o Mackenzie de instituição homofóbica”, diz. “A universidade se chama Universidade Presbiteriana Mackenzie, para mim é óbvio que uma carta assinada pelo chanceler é de responsabilidade do Mackenzie”, contesta Deborah. A universidade manifestou, em nota, na última terça (16), que as opiniões do chanceler representam somente a Igreja Presbiteriana. “Definitivamente, o Mackenzie se queimou”, diz a ex-aluna. O GUIA tentou entrevistar o chanceler, mas o Mackenzie informou que só se manifestará a respeito por meio da nota oficial. VESTIBULANDOS Para os inscritos, especialmente os homossexuais, no vestibular do Mackenzie, que será realizado em 13 de dezembro, os possíveis veteranos têm um recado: “Não se deixem levar por um documento. Os alunos são a favor da lei. Aqui tem infraestrutura, nome, as pessoas são amigas. Me orgulho de ser mackenzista” – Isabelle Alegro, 20 anos “Não desistam de entrar no Mackenzie por isso. Vocês não serão maltratados nem menosprezados. Aqui é um bom lugar para estudar” – Maíra Xavier, 20 anos “As portas estão abertas a todos. Alunos e professores receberão todos da mesma forma, com respeito e amizade. Nossa lei maior é a da convivência pacífica” – Thiago Mattar, 22 anos “Não se deve pagar preconceito com preconceito. Se pensam em estudar no Mackenzie, que prestem o vestibular e vençam. Entrem e se imponham. Dinheiro não tem raça, credo, sexo. Na hora de pagar eles aceitam o cheque de todos” – Deborah Facco, 26 anos LEIA MAIS notícias de vestibular e EnemLeia mais:- ‘Beijaço’ gay da UnB vira bate-boca com defensores do ‘orgulho hétero’- "ECA é conhecida pela diversidade", diz vice-presidente da Atlética- Jornalzinho da USP incita a jogar fezes em gays; aluno foi alvo de latinhas de cerveja- Ensino religioso no Brasil estimula homofobia e exclui religiões não cristãs, diz livro- Gays estudam mais que heterossexuais, sugere pesquisa do Ministério da Saúde