Documento interno da Fuvest propõe (grandes) mudanças para a prova
Uma proposta em análise para a Fuvest do ano que vem quer cobrar livros de não-ficção, sugerir mudanças na redação e evitar que vagas fiquem desocupadas
Um documento recebido pelo GUIA DO ESTUDANTE e elaborado pela equipe da Fuvest para o grupo de trabalho da Pró-Reitoria de Graduação da USP indica que o vestibular da maior universidade do Brasil está considerando modernizar a sua prova, tornando-a ainda mais interdisciplinar.
O documento chamado “Propostas para Alterações do Vestibular de Ingresso na Universidade de São Paulo” discute alterações em quase todas as frentes da prova: elaboração das questões, número de perguntas na primeira fase, aumento e diminuição do número de convocados para a segunda fase de acordo com a nota de corte – além de novos formatos para a redação e da inclusão de outros livros obrigatórios para além de obras literárias.
As primeiras mudanças no vestibular começariam a valer a partir do ano que vem, na Fuvest 2025, e vão ao encontro com uma entrevista concedida pelo diretor da fundação ao GUIA DO ESTUDANTE no ano passado. Na época, Gustavo Ferraz de Campos Monaco afirmou que a interdisciplinaridade “veio para ficar” na Fuvest e manifestou o interesse em incluir livros que refletissem mais a realidade brasileira.
A Fuvest confirma a autenticidade do documento, embora ressalte que se trata de uma minuta interna e “uma proposta de mudanças futuras, sem previsão alguma de quando serão implantadas e mesmo se serão”. De acordo com o cronograma presente na proposta, as mudanças dependeriam da aprovação da Pró-Reitoria de Graduação (PRG) e do Conselho de Graduação (CoG) até o final deste ano.
Foucault e Marilena Chauí nas lista de obrigatórios
Ainda que as mudanças não se concretizem já no ano que vem, as propostas indicam quais são os caminhos que a Fuvest vem discutindo para adotar modernizações em sua prova. As sugestões foram elaboradas por uma equipe de especialistas no ensino das disciplinas ministradas no Ensino Médio.
Uma das principais mudanças sugeridas diz respeito aos livros obrigatórios cobrados para a realização da Fuvest. O documento admite que a lista vem recebendo “críticas por ser considerada pouco conectada com os dias atuais”, e cita um abaixo-assinado criado por estudantes do Ensino Médio da Escola Nossa Senhora das Graças, em São Paulo, que pediu a inclusão de mais obras escritas por mulheres.
Mas a proposta de mudanças vai além da inclusão de autoras. O grupo de trabalho sugere a inserção de livros de não-ficção na lista de leituras obrigatórias. O documento propõe, por exemplo, que se cobre um rodízio entre Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Holanda, Por uma outra globalização, de Milton Santos, Retorno a Reims, de Didier Eribon, Vigiar e Punir, de Michel Foucault e O que é ideologia?, de Marilena Chauí.
E a redação?
O documento também sugere mudanças na temida redação da Fuvest, sugerindo que ela possa passar a cobrar outros gêneros textuais na prova, além da tradicional dissertação. A ideia está sendo debatida “mesmo que a decisão final seja no sentido de manter o padrão hoje adotado”, de acordo com o documento.
Essa seria outra medida para atualizar a prova. Aqui no GUIA DO ESTUDANTE já apontamos, por exemplo, que a dissertação de ingresso para a USP parece, aos olhos dos estudantes e especialistas, valorizar palavras difíceis e o uso de linguagem excludente.
O inglês de volta à segunda fase
A principal mudança, porém, deve ficar no tipo de questões que serão cobradas, que ficariam mais interdisciplinares – como é feito no Enem, por exemplo. A ideia é que possam ser cobrados conceitos de mais de uma disciplina em cada pergunta, o que levaria a uma diminuição no número de questões na primeira fase – de 90 de múltipla escolha, como é atualmente, para 80, de acordo com o documento.
Para a segunda fase, a mudança ficaria na estrutura da prova. Em vez de 25 provas diferentes, o segundo dia passaria a ter apenas seis questionários distintos. O primeiro dia ficaria dedicado às linguagens, das quais o inglês voltaria a fazer parte.
Já a prova do segundo dia seria composta por 12 perguntas: 4 questões interdisciplinares de todas as áreas, mais 8 questões específicas determinadas pela escolha dos curso dos estudantes. O conteúdo passaria a incluir também conteúdos de sociologia, filosofia, artes e educação física – essa última, dentro da categoria de “linguagens”.
Fim das vagas não preenchidas?
O documento afirma que um dos problemas constatados pela Fuvest nos últimos anos é o não preenchimento das vagas para alguns cursos, em especial aqueles com menor procura. Para resolver o impasse, a banca sugere uma mudança na classificação para a segunda fase.
A ideia é que a relação candidato/vaga nesta etapa não seja fixa para todos os cursos, como ocorre hoje, e que oscile entre 3 e 5 candidatos. Cursos com menos concorrência chamariam mais candidatos por vaga para a segunda fase, para não eliminar já na primeira fase estudantes que realmente têm a intenção de se matricular. Já cursos historicamente muito concorridos, como Medicina e Psicologia, convocariam menos candidatos.
Por fim, para sanar o problema de vagas ociosas, a Fuvest propõe ainda a “reescolha” de cursos ao longo do processo de matrícula. Depois da terceira chamada, os candidatos que não foram convocados para os cursos para os quais se inscreveram no vestibular terão a opção de escolher uma outra carreira em que estejam sobrando vagas. A ideia é que esta possibilidade de “reescolha” aconteça em dois momentos: entre a terceira e quarta, e quarta e quinta chamada.
A divulgação do documento não estava prevista para acontecer ainda. Quando perguntada sobre as mudanças, a Fuvest disse que “está constantemente fazendo estudos para apoiar a USP na tomada de decisão em relação às formas de ingressos e possíveis melhorias nos processos”.