Quando Vinícius Andrade entrou no curso de Economia na Universidade de São Paulo (USP), percebeu que no campus de Ribeirão Preto, no interior do estado, haviam poucos estudantes como ele, de baixa renda e vindos de escola pública. O jovem de 22 anos também já chegou a acreditar que o ensino superior não era uma opção em sua vida, mas, após entrar na faculdade, decidiu que faria de tudo para tornar a educação acessível para esses alunos.
O Projeto Salvaguarda, idealizado pelo futuro economista, tem o objetivo de mostrar aos estudantes da rede pública que os bancos das universidades devem ser ocupados por eles, especialmente os de uma instituição tão concorrida como a USP. “Nós queremos empoderar esses alunos e mostrar que eles são capazes de ser o que quiserem, por isso optamos por mostrar os caminhos e ajudar a conquistar os objetivos”, conta Vinícius.
Para isso, o projeto conta com cerca de 200 voluntários, a maior parte oriundo de escolas públicas, que desempenham atividades com alunos do ensino médio. A iniciativa começou a ganhar corpo em janeiro de 2017, e hoje atende 1375 estudantes de dez instituições públicas de Ribeirão Preto e uma de Jardinópolis.
Os voluntários, que geralmente são alunos da universidade, professores e graduados, vão até os colégios para falar sobre carreiras e a seleção para o ensino superior. Vinícius lembra que a maior parte dos estudantes nunca cogitou fazer uma universidade. O jovem fez uma pesquisa com 193 alunos das escolas estaduais da cidade e só 13 deles conheciam a Fuvest, fundação responsável pelo processo seletivo da USP. Metade apenas sabia que o Enem era utilizado para ingressar na graduação.
“Menos de 10% dos alunos conhecia o Sisu e o Prouni. Muitos não sabiam nem que existia cursinho. É uma triste realidade, porque boa parte desses jovens acha que o único caminho é trabalhar, que vestibular e universidade é coisa de rico. E quando nós, universitários vindos de escola pública, conversamos na sala de aula, eles gostaram muito. Era uma fala de igual para igual, então o aluno se sente mais próximo”, explica.
Preparação para o vestibular
Além das conversas com alunos de todo o ensino médio, o Salvaguardas tem ações específicas para vestibulandos Para cada escola é criado um grupo de apoio no WhatsApp com seis voluntários de diversas áreas do conhecimento. Os tutores tiram dúvidas sobre questões de prova para os estudantes do terceiro ano. Entre eles há graduandos, mestrandos, professores e profissionais de Exatas, Humanas e Biológicas.
A redação, presente no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), e nos demais vestibulares, também é um dos eixos centrais do Salvaguarda: a cada 15 dias, os voluntários postam um tema de redação no grupo e vão até as escolas para entregar folhas pautadas, como as do Enem, para que os alunos do terceiro ano do ensino médio possam fazer o texto.
No dia seguinte, os 80 facilitadores do projeto buscam as dissertações para corrigir e devolvê-las aos vestibulandos. Os voluntários são treinados por professores do curso de Letras e aprendem técnicas de correção. Vinícius conta que muitos alunos do colégio não haviam feito redações há pelo menos dois anos. “Muitas vezes eles não têm contato com esse mundo, não sabem que é possível. E eles gostam muito de ter essa oportunidade”, diz.
Inserção na universidade
Os alunos do terceiro ano que participam do projeto serão inscritos gratuitamente nos vestibulares pelos tutores, conta Vinícius. O Salvaguarda também fará visitas guiadas no campus da USP entre maio e junho para que os estudantes do ensino médio possam conhecer a universidade. O projeto também orienta estudantes a conseguir auxílios de permanência, como alimentação e transporte, dentro das instituições.
“Para o estudante que quer saber mais sobre uma profissão, nós passamos também o contato de pessoas que já trabalham na área há um tempo, ou que pelo menos estão quase se graduando e já fizeram estágios. Assim, eles podem conhecer melhor como funciona um curso ou uma carreira”, diz.
Financiamento e ampliação
Os primeiros passos do Salvaguarda estão sendo dados agora no início do ano. O objetivo dos voluntários é que o projeto esteja em todas as escolas públicas de Ribeirão Preto até 2018 e, se possível, que também alcance outras cidades, ressalta o idealizador. “Eu não consigo acreditar no quanto o projeto está dando certo. Quero expandir o máximo que puder, porque pensar que esses alunos vêem a universidade como um caminho possível paga qualquer esforço nosso!”
A iniciativa é bancada inteiramente com dinheiro dos próprios voluntários. No entanto, recentemente, eles conseguiram apoio da universidade para imprimir 22 mil folhas de redação para o ano inteiro. Vinícius diz que qualquer ajuda é bem vinda e espera que mais pessoas possam incentivar o projeto a sair do papel. Atualmente, eles precisam de transporte para levar os alunos à universidade, lanches para os adolescentes nos encontros nas escolas e recursos para confeccionar a camiseta do Salvaguarda.
Para ajudar ou ser um voluntário do projeto, basta enviar uma mensagem para a página no Facebook. “Quero sair das escolas com esses alunos sabendo que existem universidades e que eles têm direito de estar nelas e podem querer ou não seguir esse caminho. Ele pode até não ter vontade de estudar, mas só de saber que pode mais, já é um grande passo. A educação é libertadora. Para a gente que é pobre, estudar é se libertar”, reforça Vinícius.